segunda-feira, 12 de junho de 2017

SEMINÁRIO 35 - MÓD. IV - TUTELA PROCESSUAL CONSTITUCIONAL

ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” – Especialização em Direito do Consumidor
MÓDULO 4 - Seminário 35, de 19/03/2015
TUTELA PROCESSUAL CONSTITUCIONAL

1) Como devem ser harmonizados os princípios constitucionais da proteção do consumidor e os princípios do devido processo legal e da ampla defesa? A facilitação da defesa dos direitos do consumidor em Juízo significa violação do devido processo legal? A inversão do ônus da prova traduz violação da ampla defesa?
R: O CDC, no art. 1º preceitua que o código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, com fundamento nos artigos 5º, XXXII, 170, V, da CF e no art. 48, do ADCT.
Visando ao equilíbrio da relação de consumo, o artigo 4º do CDC elenca uma série princípios inspirados na Constituição Federal, tais como o da dignidade do consumidor, da saúde e da segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia, vulnerabilidade, hipossuficiência etc, guardando, portanto, perfeita harmonia com a Constituição Federal.
Todos esses princípios que fundamentam a proteção e defesa do consumidor visam dar equilíbrio numa relação que na sua origem já nasce desequilibrada.
Os princípios do devido processo legal e da ampla defesa devem ser respeitados na relação de consumo conferindo às partes da relação o direito a um processo justo, acesso à justiça, a publicidade, acesso aos órgãos judiciários (art. 6. VII, do CDC), proteção jurídica aos necessitados (art. 6º, VII, do CDC) etc.
A facilitação da defesa dos direitos do consumidor já se trata da aplicação do princípio do devido processo legal. O devido processo legal visa a dar tratamento isonômico às partes em Juízo. E como dar tratamento isonômico se elas são desiguais desde sua origem? O devido processo legal seria violado se não se conferisse facilitação da defesa dos direitos do consumidor, porque essa facilitação é que traz as partes a uma situação equilibrada.
Não haverá violação ao princípio da ampla defesa se a inversão do ônus da prova for conferida ao fornecedor no sentido de provar que o ato foi realizado ao consumidor. Visa aqui proteger o próprio fornecedor que tem o direito de provar o que fez, já que a ninguém é possível impor a produção de prova negativa.
2) A proteção constitucional do consumidor afeta a postura do juiz no processo civil? Na efetivação dos direitos constitucionais e básicos do consumidor, o juiz perde sua imparcialidade?
R: Como já se sabe, a proteção do consumidor será promovida pelo Estado e configura direito fundamental, nos termos do artigo 5º, XXXII, da Constituição Federal. Assim sendo, o juiz, que aplica as leis elaboradas pelo Estado e que também faz parte dele, deve decidir em consonância com essa ótica protetiva.
Com relação ao processo civil, o magistrado tem ferramentas legalmente previstas que reequilibram a relação entre consumidor e fornecedor e tem o dever de aplicá-las, mas isso não significa que deve haver uma superproteção, tendo em vista justamente a imparcialidade do magistrado que precisa ser mantida na instrução processual.
Portanto, o juiz deve garantir os direitos processuais do consumidor, positivados tão somente para alcançar o equilíbrio decorrente de sua vulnerabilidade econômica, jurídica e informacional, não devendo privilegiar de forma desmotivada e sem base legal (constitucional ou principiológica) o consumidor, sob pena de tornar-se parcial.
Com relação ao direito material, o juiz é livre para se convencer, desde que fundamente sua decisão, nos termos do artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. 
3) Ao analisar o caso concreto, o juiz pode aplicar o princípio da proporcionalidade para contrapor o direito do consumidor ao direito do fornecedor? Por exemplo, na análise da impenhorabilidade de um bem de família de um fornecedor, que princípio (consagrando direito fundamental) deve prevalecer, a proteção do consumidor pelo Estado ou o direito à moradia? A dignidade humana deve influenciar nesta análise?
R: Os princípios da ponderação, razoabilidade, proteção do consumidor, dignidade da pessoa humana, bem como o direito fundamental à moradia são normas constitucionais que possuem igualdade hierárquica, segundo entendimento do STF.
Diante da situação ventilada, é necessário estabelecer a denominada teoria da ponderação dos princípios constitucionais, que consiste, em breve síntese, na análise do caso concreto para se determinar qual norma constitucional deverá prevalecer.
Na situação em concreto, o magistrado poderá relativizar o principio da moradia (impenhorabilidade do bem de família) e também a proteção ao consumidor, devendo chegar a um ponto em comum capaz de satisfazer o crédito do consumidor, mas também tutelar a moradia do fornecedor. Para essa relativização é possível aplicar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, fazendo com que o fornecedor perca parte de seu patrimônio para satisfazer o consumidor, mas mantenha o mínimo para que consiga exercer seu também direito constitucional à moradia.
Como dito, as normas constitucionais tem igual hierarquia, e a constituição deve ser interpretada como um todo (princípio da unidade constitucional), portanto nessa relativização deve-se usar não somente o principio da dignidade da pessoa humana, mas também outros aplicáveis ao caso, como, por exemplo, o da função social da propriedade.
4) A partir dos princípios constitucionais da tutela do consumidor e da duração razoável do processo, o juiz pode ordenar que uma prova pericial seja realizada fora do IMESC, diante da demora da perícia nesta autarquia e da insuficiência técnica (falta de condições de realização de diligências externas e carência de profissionais e exames)? Fazer a análise crítica do acórdão do Agravo de Instrumento nº 990.10.125367-4, TJSP, 8º Câmara de Direito Privado, relator o Desembargador CAETANO LAGRASTA, julgado em 23.06.2010.
R: Aplicando o princípio constitucional do acesso à justiça (Art. 5º, XXXV e LXXIV), numa ordem jurídica justa, e o princípio da duração razoável do processo (Art. 5º, LXXVIII), todos da Carta Republicana, especialmente quando está configurada uma relação de consumo (Art. 5°, XXXII, CF/88) e (Art. 6, VIII, CDC), como é caso do Acórdão em comento, o juiz, valendo-se também dos princípios da solidariedade e da igualdade entre as partes, a fim de facilitar a defesa do consumidor em juízo, certamente poderá ordenar que uma prova pericial seja realizada fora do Órgão responsável, adotando, desde logo, a prova dinâmica como circunstância do verdadeiro e eficaz julgamento.

Nesse sentido, na análise crítica do Acórdão em Agravo de Instrumento nº 990.10.125367-4.TJSP, entendemos que o juiz objetivou dar um desfecho célere e garantidor da ampla defesa e do contraditório de ambas as partes, acertando na decisão de autorizar que fosse feito novo laudo, nomeando um perito de sua confiança e sendo custeado pelos requeridos, em razão dos graves problemas que a consumidora suportaria pela inércia do IMESC em produzir esse documento.


Vale lembrar que os óbices de ordem técnica e de recursos humanos que o IMESC enfrenta não podem servir de justificativa para a morosidade da produção do novo laudo, muito menos exigir que o consumidor vulnerável e hipossuficiente, tanto técnica como economicamente, tenha que aguardar pacientemente por uma prova pericial.

SEMINÁRIO 38 - MÓD. IV - AÇÕES COLETIVAS DE CONSUMO

ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” – Especialização em Direito do Consumidor
MÓDULO 4 - Seminário 38, de 16/04/2015
AÇÕES COLETIVAS DE CONSUMO


1)  Quais as ações coletivas que podem ser utilizadas na defesa dos consumidores?
Segundo o art. 83, do CDC, c.c. o art. 21, da Lei nº 7.347/85 (Lei de Ação Civil Pública – LACP), toda espécie de ação pode ser interposta para defesa de interesses transindividuais, seja ela de conhecimento (declaratória, constitutiva e condenatória), cautelar e de execução.
No ordenamento jurídico, temos como exemplo de ações coletivas: o mandado de segurança coletivo, a própria ação civil pública, ação popular, ação de improbidade administrativa, a ação direta de inconstitucionalidade entre outras.
Todas essas ações coletivas podem e devem ser utilizadas para defesa dos direitos dos consumidores.
2) O Ministério Público tem legitimidade para a defesa de direitos individuais homogêneos de qualquer espécie relacionados ao direito do consumidor? E para a defesa de direito individual do consumidor à saúde? É possível a atuação conjunta de Ministérios Públicos Federal e Estadual em qualquer hipótese de proteção do direito do consumidor? O Ministério Público pode aditar a inicial da ação coletiva promovida por outro legitimado?
Configurado o interesse social na relação de consumo, tem-se que o Ministério Público possui legitimidade para defender direitos individuais homogêneos, tendo em vista que inexiste qualquer restrição na norma contida no art. 81, parágrafo único, inc. III, do CDC. Nunca é demais ressaltar que sua atuação nessa seara também decorre da função institucional conferida pelos artigos 127 e 129 da Constituição Federal.
Ademais, cumpre registrar que a aplicação da Lei de Ação Civil Pública (art. 5º, § 1º) se dá em conjunto com o CDC (art. 82, I), diante de seu caráter integrativo.
A base da legitimidade do MP se concentra na relevância social; circunstância que se observa em decorrência da natureza da lesão, o bem jurídico tutelado, número de pessoas atingidas, dificuldade das vítimas em acessar a justiça e a urgência da questão abordada.
Em se tratando de defesa de direito individual do consumidor à saúde não se vislumbra pertinência em admitir a atuação do MP, tendo em vista a ausência de interesse social. A exceção se dá quando a pretensão envolver criança e adolescente ou pessoas idosas, uma vez que, nestas hipóteses, o ordenamento jurídico prevê a atuação do parquet, com repercussão de seus efeitos para a coletividade (Estatuto da Criança e do Adolescente: art. 201, V; Estatuto do Idoso: art. 74, I).
O Ministério Público, a despeito de considerado órgão uno (art. 127, § 1º, da CF) possui divisões em razão da matéria (MP do Trabalho, por exemplo) e territorial (MP Estaduais e Federal). Isto não impede a atuação conjunta de seus segmentos, na medida em que a especificação da matéria, por exemplo, permite que agindo juntos possam acrescentar competências e eficácia técnica para o desempenho em benefício do consumidor.
Ainda que a ação coletiva seja ajuizada por qualquer outro legitimado, o Ministério Público terá competência/legitimidade para aditar o pedido inicial. Isto, porque se trata de legitimação concorrente, o que admite o instituto do litisconsórcio.
Outrossim, tendo em vista a presença do interesse social, a atuação do Ministério Público se apresenta como imprescindível, ainda que atue como “custos legis” na defesa e proteção do consumidor.
  
3) A Defensoria Pública tem legitimidade para a propositura de Ação Civil Pública na defesa dos direitos dos consumidores? E os sindicatos e associações? O Centro Acadêmico pode promover uma ação coletiva?
Sim, a Defensoria Pública tem legitimidade para a propositura de ACP, conforme o art. 5º, da Lei nº 7.347, de 24/07/85 (Lei de Ação Civil Pública), assim como o MP, a União, os Estados, o DF e os Municípios, Autarquias, empresas públicas, Fundações ou Sociedades de Economia Mista e as Associações que concomitante estejam constituídas há pelo menos 1 (um) ano, nos termos da lei civil, e que inclua ente sua finalidade institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, a livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico e paisagista. Cabe salientar que a Defensoria agirá quando, no caso concreto, houver a presença de necessitados. Já os sindicatos possuem legitimidade para ajuizar ACP para a defesa de interesses coletivos com base no art. 129, inciso III e §1º, da Carta da República, assim como o art. 5º, da Lei 7347/85 (LACP).

Sobre os Centros Acadêmicos, especialmente os centros acadêmicos de direito, inserem-se na categoria de associação civil, sendo pessoa jurídica constituída pela união de pessoas cujos objetivos não econômicos se convergem. Logo, na condição de associação civil, o centro acadêmico tem legitimidade para ajuizar ACP no interesse dos estudantes do respectivo curso, pois se trata da defesa de direitos individuais homogêneos, haja vista a melhor interpretação do regulamento da faculdade e a avença entre a instituição de ensino e os alunos através de contrato de adesão celebrados entre a Instituição de ensino e cada aluno. Nesse sentido, o STF e o STJ firmaram entendimento no sentido de ser viável a defesa coletiva de direitos pelos centros acadêmicos, através de ACP, conforme dispõe o art. 82, IV, CDC e art. 5º, da Lei nº 7.347/85 (RE 436.047/PR/05 e Resp 1.189.273-SC/11, Rel. Min. Luis Felipe Salomão.)
  

4) É cabível a desistência da ação civil pública em defesa de direitos do consumidor, quando promovida pelo Ministério Público? E quando promovida por outros legitimados (associação, por exemplo)? A transação é possível quando relacionada a direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos?
Sim, pode o Ministério Público desistir da ação que ele mesmo propôs, porém, não pode renunciar a um interesse social, já tem como institucional a defesa de direitos e interesses difusos e coletivos (art. 129, III, CF). Assim, havendo perda do objeto por fato superveniente, o Ministério Público pode sim desistir da ação como forma de boa-fé processual.
Se outros legitimados promoverem ação coletiva e dela desistirem, cabe ao Ministério Público assumir a condução da mesma (art. 5º, §3º, LACP) e, nesse caso, notando falta de fundamentação, poderá desistir de sua tramitação, sem violar dever funcional algum.
Se não houver prejuízo do interesse social, pode ser sim realizada no tocando ao prazo e forma de atendimento do pleito, mas jamais renunciando a direitos sociais, como por exemplo, termo de ajustamento de conduta.

5) É cabível a assistência e a intervenção de terceiros (notadamente a denunciação da lide) nas ações coletivas?
A denunciação da lide, assim como as demais intervenções de terceiros é expressamente proibida, proibição esta prevista pelo art. 88 do CDC. Tal previsão legal tem por objetivo garantir a celeridade processual e a proteção ao consumidor. Se aceita fosse a assistência e intervenção de terceiro nas ações coletivas, por certo retardariam a celeridade e efetividade do processo, sendo contraditória a própria solidariedade presumida, entre os fornecedores. Cabe destacar que se diante do caso concreto, esta facilitar a obtenção do resultado prático como, por exemplo, o ressarcimento ao consumidor, ela será excepcionalmente permitida.




SEMINÁRIO 36 - MÓD. IV - TUTELAS DE URGÊNCIA NO CDC

ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” – Especialização em Direito do Consumidor
MÓDULO 4 - Seminário 36, de 26/03/2015
TUTELAS DE URGÊNCIA NO CDC

1) Quais os requisitos da concessão da tutela antecipada do artigo 273, I, do CPC? Há diferença entre tutela antecipada e medida cautelar? Há diferença entre “fumus boni iuris” e “verossimilhança”? O que é prova inequívoca?
Quais os requisitos da concessão da tutela antecipada do artigo 273, I, do CPC?
R: Os requisitos da concessão da tutela antecipada constituem-se por pressupostos legais de duas ordens: os NECESSÁRIOS (“fumus boni iuris”) e os CUMULATIVOS-ALTERNATIVOS (“periculum in mora”).
Os NECESSÁRIOS encontram-se no “caput” do art. 273 como sendo a existência de prova inequívoca e verossimilhança da alegação.
Os CUMULATIVOS-ALTERNATIVOS encontram-se expressos nos incisos I e II do art. 273, do CPC. O inciso I diz respeito ao fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação (“periculum in mora” = perigo de infrutuosidade); o II diz respeito à caracterização de abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu (“periculum in mora” = perigo de retardamento).
A partir desses dados, possível dizer que os requisitos da tutela antecipada do art. 273, I compreende a junção dos NECESSÁRIOS como sendo a prova inequívoca e verossimilhança da alegação (“fumus boni iuri”) mais o CUMULATIVO-ALTERNATIVO do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação (“periculum in mora” = perigo de infrutuosidade).
Há diferença entre tutela antecipada e medida cautelar?
Sim, há diferenças entre TUTELA ANTECIPADA e TUTELA CAUTELAR, quais sejam:
Quanto à função, podemos dizer que a ANTECIPAÇÃO DA TUTELA visa à obtenção de efeitos práticos, concretos e reais da tutela jurisdicional antes do tempo em que normalmente ocorreriam, enquanto a TUTELA CAUTELAR objetiva assegurar, salvaguardar um direito ameaçado. Assim sendo, a natureza da primeira é satisfativa, enquanto da segunda, é assecuratória.
Quanto aos pressupostos, podemos afirmar que os da ANTECIPAÇÃO DA TUTELA prevista no CPC são mais rigorosos no que tange à verossimilhança, e a urgência pode ou não ser exigida; já os da CAUTELAR são mais singelos, já que é tutela conservativa, e ela sempre pressupõe urgência (são os chamados fumus boni juris e periculum in mora). No entanto, nas lides de consumo, por incidência do art. 84 do CDC, os requisitos da tutela antecipada são mais brandos.
Há diferença entre “fumus boni iuris” e “verossimilhança”?
O professor CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO já chegou a afirmar que a prova inequívoca que convença o magistrado da verossimilhança da alegação é mais que o fumus boni juris (“A exigência de prova inequívoca significa que a mera aparência não basta e que a verossimilhança exigida é mais do que o fumus boni juris exigido para a tutela cautelar”). Entretanto, em obra mais recente, afirma:
“Nos dizeres do art. 273, caput, do CPC a tutela antecipada será outorgada quando existir prova inequívoca suficiente para convencer o juiz da verossimilhança da alegação da parte – e a doutrina, interpretando essa redação não muito clara, é pacífica ao entender que ali está a exigência de suficiente probabilidade de existência do direito, ou fumus boni juris”.
Não parece ser esta, no entanto, a escolha legislativa, afinal os requisitos da antecipação da tutela representam um grau mais intenso de convencimento que o fumus boni juris, pois o juízo cognitivo da antecipação da tutela, ainda que superficial, é mais profundo que o da tutela cautelar. Se assim não fosse, bastaria ao legislador reformista que utilizasse as mesmas palavras de que se valeu o Código ao se referir às medidas cautelares – e que, à época, já eram de grande conhecimento de todos.
O que é prova inequívoca?
É aquela robusta, contundente que, por si só, ofereça a maior margem de segurança possível sobre a existência ou inexistência de um fato e de suas consequências jurídicas.
2) No CDC, a concessão de liminar a partir do artigo 84, §3º prevê como requisito a relevância da fundamentação. Qual o alcance? É o mesmo que verossimilhança? Aplica-se somente à obrigação de fazer e não fazer ou também alcança obrigações de entrega de coisa e pagamento?
R: Nos termos do art. 84, §3º, do CDC, nas relações eminentemente de consumo, é relevante o fundamento da demanda para a concessão da tutela antecipada, pois o seu alcance é muito mais abrangente no que tange ao termo “verossimilhança” do art. 273 e do 461, do CPC. Vale dizer que, inobstante serem termos parecidos, não se confundem na análise desses dois institutos (CPC e CDC).
O Prof. Nélson Néri Júnior assevera que nas relações de consumo não se pode pensar apenas em compra e venda. Nesse sentido, o juiz não só concederá a tutela específica da obrigação, assim como as providências que assegurem o resultado prático equivalente ao adimplemento.
Ressalta-se que o caput do art. 83, do CDC, é pouco utilizado para esses casos, mas o referido artigo informa que: “Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este Código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela”.
Diante disso, o legislador procurou proporcionar total e irrestrita efetividade processual para a proteção integral do consumidor, reparação dos danos surgidos na relação, inversão do ônus probatório e a condição de vulnerabilidade (hipossuficiência). Logo, para a concessão da tutela específica, as obrigações de entrega de coisa e pagamento também são abrangidas. O entendimento é no sentido de que, no caso de “obrigação de entrega de automóvel da mesma marca, modelo, inclusive com os mesmos acessórios, traduz-se em obrigação de dar, de entrega de outro bem, e não de fazer.” (REsp 971.917-PE, 4ª Turma STJ, rel. Min. Carlos Fernandes Matias-DJ 06.10.2008. Então, é legítima a amplitude da interpretação do art. 84, §3º, do CDC, quando há uma relação de consumo.
3) Que medidas de apoio deve o advogado requerer e o juiz deferir nos seguintes casos: a) exclusão do nome do consumidor dos arquivos de consumo, b) determinação para que a empresa de telefonia deixe de lançar nas faturas uma cobrança discutida em juízo, c) realização de uma cirurgia para colocação de prótese, d) retomada do fornecimento de água ou energia elétrica.
R: a) Para excluir o nome do consumidor dos arquivos de consumo, o advogado deve utilizar o habeas data e o fundamento para tal exclusão encontra-se previsto no art. 43, §3º, do Código de Defesa do Consumidor;
 b) Para determinação para que a empresa deixe de lançar nas faturas uma cobrança discutida em juízo, se deve utilizar da ação declaratória de inexigibilidade do débito com pedido de tutela antecipada a fim de que fique suspensa a cobrança até julgamento definitivo da lide, nos termos do art. 273, do CPC;
c) Para realização de uma cirurgia para colocação de prótese o advogado deve ajuizar uma ação de obrigação de fazer c/c pedido de tutela antecipada, nos termos do art. 84, §3º, do Código de Defesa do Consumidor;
d) Neste caso, se o corte foi realizado em razão de cobrança de débito indevido, o advogado deve ajuizar ação declaratória de inexigibilidade de débito c/c pedido liminar para retomada da energia elétrica e indenização por danos morais, em face da cobrança indevida e dos danos suportados pelo desligamento da energia. Em outros casos, pode ser ajuizada ação cautelar com pedido de retomada da energia ou ação de obrigação de fazer a fim de que a concessionária forneça a energia, sob pena de multa diária, com fundamento material no artigo 22, do Código de Defesa do Consumidor.
4) Haverá mudança substancial na disciplina das tutelas de urgência no NOVO CPC? É possível ao juiz aplicar as tutelas de urgência de acordo com as armas do NOVO CPC antes de entrar em vigor? Analisar a questão diante da situação da execução provisória da multa processual verificando o acórdão do STJ (do tema em sede de recursos repetitivos) e do TJSP (julgado em 2015 do Des. Enio Zuliani, Agravo de Instrumento nº 2153986-52.2014.8.26.0000).
R: O novo CPC traz mudanças substanciais nas tutelas de urgência (recomenda-se a leitura do artigo: http://jus.com.br/artigos/28980/tutela-de-urgencia-e-tutela-da-evidencia-no-anteprojeto-do-novo-codigo-de-processo-civil, acessado em  09.04.2015)
As tutelas de urgências foram divididas em basicamente duas (tutela de urgência e tutela de evidência):
A-     Tutela de urgência: essa hipótese configuraria institutos semelhantes às atuais tutelas antecipada e às cautelares inominadas (já que não há mais previsão de cautelares típicas no novo CPC).
B-     Tutela de Evidência: já a tutela de evidência configura novidade legislativa, que tenta trazer uma antecipação do provimento final, nas hipóteses taxativamente elencadas na lei, visando uma celeridade em ações notoriamente plausíveis. As situações trazidas no art. 285 dispensam a comprovação do dano irreparável ou de difícil reparação, o que torna mais objetiva a constatação e o deferimento pelo magistrado.
Com relação à aplicabilidade do novo CPC antes de sua entrada em vigor, temos 3 vertentes:
A-     Normas jurídicas novas: são as normas jurídicas detentoras de inovação em relação ao CPC anterior, e configuram mudança substancial das regras objetivas anterior. Um exemplo é a alteração dos requisitos da petição inicial (art. 320, II e VII, novo CPC). Essas regras não produzem qualquer eficácia durante a vacatio legis.
B-     Pseudonovidades normativas: São normas que, apesar de não constarem no código anterior, refletem outras normas-princípios já em vigor anteriormente. Normas constitucionais, por exemplo, foram materializadas em novas disposições, mas já eram aplicadas no CPC vigente. Exemplo disto é a regra trazida no art. 380, §1º que determina que o juiz, ao redistribuir o ônus da prova, oportunize a parte a quem ele foi incumbido, que se desonere dele. É a materialização do contraditório. Assim, podem ser utilizados atualmente como reforço de argumentação, inclusive para demonstrar a atual vertente de determinados princípios.
C-      Normas simbólicas: são espécies de normas-objetivo. Isso significa que essa vontade do legislador traduz uma necessidade atual de mudança, e que muitas vezes já está sendo aplicada. Um grande exemplo disto é a adoção de políticas públicas para solução de conflitos através dos métodos de conciliação, sem que haja necessidade de provimento jurisdicional litigioso. Um exemplo é a norma contida no novo art. 1083 do CPC. Como essas normas vem apenas materializar condutas que já vêm sendo adotadas, é possível falar em aplicação imediata também.
Por fim, com relação à execução provisória de multa diária temos que a legislação autoriza que, nas ações que tenham por objeto o cumprimento de uma obrigação de fazer ou não fazer, seja fixada, por ocasião do deferimento da medida antecipatória, multa cominatória (também conhecida como astreinte) aplicável no caso de eventual descumprimento da medida judicial.
Sobre esse tema, o principal ponto de discussão na jurisprudência diz respeito à possibilidade de execução provisória da multa cominatória. O Superior Tribunal de Justiça por reiteradas vezes e com posições bastante divergentes se manifestou sobre esse assunto, admitindo, em alguns julgados, a execução provisória das astreintes (AgRg no Resp 1.299.849/MG da 3ª Turma) e, em sentido contrário, defendendo que seria impossível a execução provisória da multa cominatória sem que houvesse o trânsito em julgado da decisão de mérito da ação.
Na esteira dessa discussão, a Quarta Turma do STJ recentemente admitiu (Recurso Especial nº 1.347.726-RS) que a multa diária fixada em sede de tutela antecipada ou medida liminar somente poderá ser exigível nos casos em que a ação a que se vincula tenha sido julgada procedente e esteja sendo atacada por recurso recebido tão somente no efeito devolutivo, momento no qual o título judicial, ao menos dotado de maior segurança jurídica, torna-se líquido, certo e satisfatoriamente exigível. A multa, porém, será devida desde a data do descumprimento. Esse entendimento acaba por trazer uma posição intermediária sobre o tema porque autoriza a execução provisória da multa cominatória antes do trânsito em julgado da sentença de mérito, beneficiando, assim, o credor, e garantindo a efetividade da tutela concedida.

Por outro lado, diminui o risco patrimonial para a parte demandada, na medida em que se exige, para a execução provisória das astreintes, ao menos o julgamento do mérito da ação com a confirmação da medida antecipatória deferida e, ainda, que eventual recurso interposto tenha sido recebido apenas no efeito devolutivo.

domingo, 11 de junho de 2017

SEMINÁRIO 37 - MÓD. IV - AÇÕES INDIVIDUAIS DE CONSUMO

ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” - Especialização em Direito do Consumidor
MÓDULO 4 - Seminário 37, de 09/04/2015
AÇÕES INDIVIDUAIS DE CONSUMO


1) Qual o alcance do artigo 83 do CDC? O juiz deverá ser mais parcimonioso na verificação das condições da ação, admitindo-se o interesse processual (adequação entre causa de pedir e pedido) com maior amplitude?
R.: Disciplina o art. 83 do CDC: “Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela.”. Assim, entendemos que o legislador pretendeu maior amplitude na defesa do consumidor hipossuficiente.
Razoável que o magistrado seja menos rigoroso em determinadas situações, relevando pequenas falhas procedimentais e não se apegando ao formalismo exagerado, privilegiar-se-á o consumidor, em tese, prejudicado.
Todavia, nem todo erro se justifica, imprescindível que seja respeitado o princípio constitucional do devido processo legal (art. 5º, LV, da CF - “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”). Portanto, a acessibilidade disposta no art. 83 do CDC, a nosso ver, não pode afrontar o princípio do devido processo legal.
2) A prerrogativa de foro do consumidor (art. 101, I, do CDC) vale também para as ações individuais? Trata-se de norma de ordem pública? Trata-se de norma de competência absoluta? O consumidor pode optar por acionar o fornecedor no foro do domicílio deste último.
R.: Sim, a prerrogativa do foro do consumidor é válida também para as ações individuais, pois tal norma visa à proteção da defesa do consumidor, que na maioria das vezes, é vulnerável diante do fornecedor. Aliás, muitas vezes o consumidor adquire determinado produto ou serviço em foro distinto do seu domicílio e o ajuizamento da ação no local da compra, certamente, dificultaria o ajuizamento da ação judicial.
Tal norma é de ordem pública e de caráter cogente, de forma que pode ser alegada a qualquer tempo pelo consumidor.
Quanto à competência absoluta ou relativa da norma, tem-se que os artigos 112, parágrafo único, e 114 do CPC, na verdade, encerram critério de competência de natureza híbrida (ora absoluta, quando detectada a abusividade da cláusula de eleição de foro, ora relativa, quando ausente a abusividade e, portanto, derrogável pela vontade das partes).
Por último, temos que o consumidor pode escolher o domicílio do fornecedor, tendo em vista que a escolha do foro é facultada a este, mas restrito ao domicilio do consumidor ou fornecedor, não podendo escolher qualquer domicilio, que não guarde relação entre as partes.

3) Qual o alcance da denunciação da lide no CDC - ela é permitida? O fornecedor pode fazer a denunciação da lide da seguradora? Em caso negativo, e se houver concordância do consumidor? Como deve ser a sentença condenatória em relação ao denunciado? (condenação direta em favor do autor consumidor ou somente a condenação em favor do réu denunciante?) (ver julgamentos de recursos do STJ)
R.: Há divergência doutrinária e jurisprudencial acerca da possibilidade de denunciação da lide nos processos que envolvam relação consumerista. São dois posicionamentos:
A-     Para parte da jurisprudência, o entendimento que prevalece é a impossibilidade de denunciação da lide nessas ações, pela interpretação extensiva do art. 88 do CDC. Isso porque nas ações de consumo, não há discussão subjetiva da culpa, o que afastaria a necessidade da denunciação da lide e confrontaria com o princípio do CDC da facilitação da defesa do consumidor. Para esses, somente seria possível o chamamento ao processo pelo fornecedor de seguradora, e a condenação se daria na forma do art. 80 do CPC, visando uma maior efetividade na reparação integral aos danos suportados pelo consumidor.
B-     Para outra parte, há necessidade de se analisar o caso concreto, visto que, dependendo da situação, a denunciação da lide pode ser vantajosa ao consumidor, inclusive para que ele garanta a satisfação de seu crédito constituído na sentença. O fundamento legal para essa corrente é o princípio da reparação integral dos danos suportados pelo consumidor.
Com relação à denunciação da lide, o art. 101, II, do CDC, estabelece que o réu fornecedor poderá chamar ao processo a seguradora (caso possua essa relação com uma). Essa hipótese não caracteriza a intervenção de terceiros denominada denunciação à lide, visto que a sentença condenatória final seguirá o trâmite do art. 80 do CPC, condenando ambos solidariamente (e não apenas concedendo um título para que o réu, após indenizar, regressa em relação à seguradora - como regularmente ocorre com a denunciação à lide).
Quanto às demais hipóteses de denunciação deve-se analisar os entendimentos supracitados. Para os adeptos da segunda opinião, poderia haver a denunciação no caso de melhor reparação posterior ao consumidor. Com isso, surge a dúvida de quem seria o legitimado para constatar essa vantagem: o juiz ou o próprio consumidor-autor?
Há divergência entre os posicionamentos. Para os que defendem ser o Juiz o detentor desse poder, entendem ser aplicável com base no art. 83. Para os que entendem ser o consumidor detentor, se fundam na disponibilidade do direito discutido.
4) O consumidor pode fazer a denunciação da lide (ou chamamento ao processo) da EMPRESA DE PLANO DE SAÚDE (OU DE SEGURO SAÚDE) na ação promovida pelo Hospital para a cobrança de preço, como forma de facilitação dos seus direitos em Juízo?
R.: É importante lembrar que é reconhecida como relação de consumo a prestação de serviços médicos. Nesse sentido, as discussões jurídicas dar-se-ão conforme as regras estabelecidas pelo Código de Defesa do Consumidor; logo, o consumidor tem o direito de eleger o polo passivo da ação indenizatória à qual tem por objeto eventual falha na prestação de serviços médicos.

É sabido que é formalmente vedada a denunciação da lide nas ações envolvendo seguro-saúde, conforme o art. 88, CDC. O STJ já firmou entendimento pela impossibilidade da denunciação da lide nas quais o denunciante tenta se esquivar de sua responsabilidade pelo evento danoso, atribuindo-a a terceiros. Destarte, o hospital deveria cobrar o preço do seu conveniado, o plano de saúde, mas por questões de interesse econômico e contratual, resolve litigar em face do consumidor, que é eminentemente mais enfraquecido nessa relação.

Então, para se alcançar o verdadeiro objetivo do instituto do chamamento ao processo, sempre na condição de réu, que é dar mais celeridade à demanda, por ser o remédio jurídico mais adequado e previsto nos art. 77 a 80, CPC, o consumidor pode pleitear a inclusão no processo como litisconsorte passivo a empresa de plano de saúde ou seguro-saúde, conforme o art. 77, III, CPC. Isso porque esse tipo de responsabilidade de terceiro seria típico de denunciação da lide e não de chamamento ao processo, já que esta última modalidade de intervenção de terceiro pressupõe solidariedade passiva entre os responsáveis pela reparação, o que, evidentemente, não há entre segurador e segurado, em face do autor da ação de indenização.


A Lei nº 8.078/90, no entanto, desviou o chamamento ao processo de sua natural destinação, com o fito evidente de ampliar a área de garantia para o consumidor. Se a seguradora permanecesse sujeita à denunciação da lide, a sentença não poderia ser executada pelo consumidor diretamente contra a seguradora. Apenas o fornecedor, depois de cumprida a condenação, teria direito de voltar-se contra esta. Uma vez, porém, que a lei especial autoriza o chamamento da seguradora, esta torna-se litisconsorte do fornecedor e, havendo condenação, o consumidor poderá executar a sentença tanto contra este como contra aquela. Com isto, evidentemente, se ampliou a garantia de efetividade do processo em benefício do consumidor.