ESCOLA
PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso
de Pós-Graduação “Lato Sensu” – Especialização em Direito do Consumidor
MÓDULO 4 -
Seminário 42
ASPECTOS
PROCESSUAIS DA RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
1) Situar a responsabilidade solidária dos fornecedores no
contexto da proteção constitucional e dos direitos básicos do consumidor? Quais
as consequências no direito material e no direito processual, em termos de
interpretação das normas jurídicas? Deve ser ampliada a possibilidade de
indenização do consumidor?
Conforme os artigos. 5º, XXXII e 170,
IV e V, da Carta Republicana de 1988, a tutela do consumidor ganhou status de norma principiológica e de lei
geral, além dos direitos básicos do consumidor inseridos pelo legislador na lei
especial, art. 6º, e Incisos. Nesse sentido, as consequências do direito
material estão ligadas ao acesso à justiça, assim como a facilitação de sua
defesa em juízo, como exemplo a alteração do regime de competência, a previsão
do foro do domicílio do autor, a inversão do ônus da prova, além, é claro, da
criação dos juizados especiais.
Embora a CF/88 preconize nos artigos
supracitados que os princípios norteadores da proteção e a ordem econômica
sejam fundados na livre iniciativa, os direitos básicos do consumidor são o
espelho do que diz a Lei Maior, ou seja, o que se busca é o equilíbrio como
resultado. A interpretação das normas jurídicas é no sentido de que todas as
atividades desenvolvidas no mercado de consumo, sejam protetivas, visando
sempre a segurança e direto dos consumidores.
Também, há a possibilidade de ampliação
da indenização do consumidor, na medida em que ele se vale da cadeia dos
envolvidos na relação contratual, razão pela qual pode demandar contra todos
eles, concomitantemente, surgindo a responsabilidade solidária justamente
porque o consumidor não consegue identificar de imediato quem realmente foi o
causador do dano, é o que aduz o art. 7º, Parágrafo Único, do CDC.
Destarte, é sempre bom lembrar que o
legislador pretendeu dar eficácia à sentença judicial, sendo assim o CDC visa à
reparação proporcional ao agravo, ou seja, a efetiva prevenção e reparação dos
danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos, conforme o art.
6º, VI, do Código Consumerista.
2). Analisar as seguintes situações:
a) Instituição Financeira (operações de financiamento ou de
cartão de crédito) e a loja que vende produtos (automóveis, móveis ou
serviços). Casos: (i) vício do produto e (ii) desistência ou rescisão do
negócio. Afeta-se o contrato de financiamento? Se a opção do consumidor for
pelo abatimento do preço ou por perdas e danos, há responsabilidade da
instituição financeira?
b) Franquia. Franqueador x franqueado como fornecedores. Há
solidariedade?
c) Fabricante de peças e o produto final. Quando o
fabricante de peças assume a responsabilidade solidária?
d) Médico, Hospital e Plano de Saúde. Quando há
solidariedade? Em qualquer hipótese? Se o consumidor escolhe o médico de sua
confiança, sem interferência do hospital (que apenas cede o local) e do plano
de saúde (que faz o pagamento do médico, porque credenciado), ainda assim estes
dois respondem solidariamente?
e) Agência de Viagens e Operadora de Turismo. Quando há
solidariedade?
a) VÍCIO DO PRODUTO: Nessa hipótese de
aquisição de bem em loja cujo valor foi financiado por instituição financeira e
depois se verificou a existência de vício
de produto, a instituição financeira não responderá solidariamente se forem
contratos distintos, ou seja, um é o contrato de financiamento e outro é o da
compra do bem.
Responderá
solidariamente, contudo, quando o consumidor é atraído pela divulgação dos
agentes financeiros por meio de cartazes, propagandas e pelo próprio vendedor
no momento da venda. A instituição
financeira acaba integrando o contrato de consumo, por força do artigo 30 do
CDC. Na hipótese de compra com concessionária de veículos, a responsabilidade
solidária se aperfeiçoa porque há uma coligação entre instituição financeira e
comerciante, tanto que o gravame da alienação fiduciária fica substanciado no
documento do veículo. Também haverá responsabilidade solidária se instituição
financeira realizou a operação de financiamento com quem havia restrições no
mercado de consumo.
DESISTÊNCIA: No caso de desistência da compra, se foi realizada
por meio virtual, a desistência poderá ser realizada em até sete dias, sem qualquer
justificativa, nos termos do art. 49 do CDC. Nessa hipótese, o contrato de
financiamento será desfeito, voltando os contratantes ao estado antes da
avença. O total ou parcelas eventualmente debitadas deverão ser devolvidas,
corrigidas ao consumidor, inclusive as despesas com frete e postagem.
A desistência não se operará, contudo, se a
compra se der pessoalmente na loja em que foi dada a oportunidade de ver,
apalpar, testar, tirar dúvidas quanto ao funcionamento de um produto. Resta ao
consumidor, diante de um vício do produto optar por uma das condutas previstas
no art. 18 do CDC, que impõe ao fornecedor a responsabilidade solidária a fim
de corrigir/consertar o vício detectado dias após a aquisição do produto.
RESCISÃO DO NEGÓCIO: Nesta hipótese o
consumidor é obrigado a quitar todo o financiamento para reaver o preço. Assim,
o banco responde solidariamente, já que permitiu o fornecedor utilizar seus
serviços e deve dar quitação à transação.
ABATIMENTO OU PERDA E DANOS: Se o
consumidor optar por abatimento do
preço ou perdas e danos subsiste ainda a responsabilidade solidária, conforme
dispõe o artigo 18 do CDC.
b)
Franquia. Franqueador x franqueado como fornecedores. Há solidariedade?
Sim, há solidariedade entre o
franqueado e o franqueador. Partindo do princípio da vulnerabilidade, para o
consumidor o responsável é a marca e não a pessoa jurídica por detrás dela.
Numa demanda, portanto, envolvendo franqueado e franqueador, ambos figurarão
solidariamente no polo passivo, por força do art. 7º, parágrafo único e dos
§§1º e 2º do art. 25, do CDC.
Com a decisão, caberá ação de regresso,
caso queira, da parte condenada a ressarcir/indenizar o consumidor.
c)
Fabricante de peças e o produto final. Quando o fabricante de peças assume a
responsabilidade solidária?
Numa demanda consumerista envolvendo
peças incorporadas no produto final, figurão no polo passivo, em solidariedade,
tanto o fornecedor de peças como o fornecedor do produto final.
Por força dos artigos 7º, parágrafo
único e do 2º do art. 25 do CDC são responsáveis solidários tanto quem
fabricou, construiu ou importou peças para incorporação como quem efetuou a
incorporação delas ao produto final.
d)
Médico, Hospital e Plano de Saúde. Quando há solidariedade? Em qualquer
hipótese? Se o consumidor escolhe o médico de sua confiança, sem interferência
do hospital (que apenas cede o local) e do plano de saúde (que faz o pagamento
do médico, porque credenciado), ainda assim estes dois respondem
solidariamente?
Médico, Hospital e Plano de Saúde são
fornecedores de serviços por definição do §2º do art. 3º do CDC.
A responsabilidade solidária existirá
entre médico, hospital e plano de saúde quando houver vínculo contratual,
empregatício, de confiança ou de credenciamento entre eles.
Se o médico foi escolhido pelo
consumidor dentre os credenciados no plano de saúde para realização de
procedimento em determinado hospital, persiste a responsabilidade solidária
entre o plano de saúde, o hospital e o médico.
Se o médico foi escolhido pelo
consumidor e o hospital cedeu o local para realização de procedimento, não
haverá responsabilidade solidária, somente subjetiva, em relação ao médico e
objetiva, em relação ao hospital. Há entendimento de que a responsabilidade é
solidária decorrente da escolha, pois o hospital autorizou que o médico
utilizasse seu espaço para procedimento.
e) Agência de Viagens e Operadora de
Turismo. Quando há solidariedade?
Ao realizarem a venda dos chamados
"pacotes turísticos" de uma operadora
de turismo, as agências de viagens
assumem uma clara posição de fornecedores de serviços, respondendo
solidariamente pela falha ou defeito do serviço, em qualquer parte do
programa turístico.
Elas possuem o dever de ressarcir
eventuais danos ocasionados, ainda que decorram da conduta de outro fornecedor
que faça parte da cadeia de prestação de serviços envolvida no "pacote
turístico", em razão do princípio da solidariedade que permeia o
fornecimento de serviços no mercado de consumo. A análise da solidariedade,
nestes casos, deve ser caso a caso.
3) Como deve ser a interpretação do artigo 7º, parágrafo único do CDC? A
responsabilidade solidária prevista no CDC exclui a possibilidade de
condenações diferentes, conforme a participação do fornecedor na ofensa? Por
exemplo, é possível impor-se uma condenação na indenização por danos morais
diferente entre os fornecedores, um valor maior para a fabricante da peça e um
valor menor para a montadora do produto (ver art. 25, do CDC), limitando-se a
solidariedade ao valor desta última?
Interpretação do artigo 7º, parágrafo único do CDC
Deve
ser interpretado “ipsis litteris”, ou seja,
pelas mesmas
letras. Trata o parágrafo único do artigo 7º do CDC da responsabilidade
solidária, onde todos os autores respondem pela reparação dos danos previstos
nas normas de consumo.
A responsabilidade solidária prevista no CDC exclui a possibilidade de
condenações diferentes, conforme a participação do fornecedor na ofensa?
Depende. Em regra, a condenação
deverá ser solidária entre os fornecedores, preservando assim o consumidor que
poderá exigir de qualquer um deles o pagamento, porém se existirem mais de um
ato ilícito é possível que hajam condenações diferentes, de acordo com a
extensão do dano causado. A análise do caso concreto e da participação dos
fornecedores envolvidos, poderá sim permitir ao juiz que condene os
fornecedores envolvidos de acordo com o dano causado, principalmente o Dano
Moral, onde acreditamos ser possível as condenações diferentes.
Por exemplo, é possível impor-se uma condenação na indenização por danos
morais diferente entre os fornecedores, um valor maior para a fabricante da
peça e um valor menor para a montadora do produto (ver art. 25, do CDC),
limitando-se a solidariedade ao valor desta última?
Apesar de entendermos que cabem
condenações diferentes por Dano Moral, como dissemos dependendo da extensão do
Dano, no exemplo acima a ofensa nos parece única, cabendo neste caso a
condenação solidária, ou seja, ambos devem ser condenados na mesma medida, de
acordo com o artigo 25 do CDC todos responderão pelos Danos causados,
solidariamente.
Os fornecedores envolvidos,
autores da conduta que se sentirem lesados, poderão em Ação de Regresso
discutir a parte que cabe a cada um, referente ao Dano Causado e aquele que
efetuar o pagamento ao autor, poderá buscar dos demais a parte que cabe a cada
um.
4) Como deve se operar o direito de regresso entre os
devedores solidários? O devedor solidário que pagou todo o débito terá direito
a ressarcir-se por montante e proporção?
Primeiramente é
importante frisar que a responsabilidade civil nas relações de consumo é
objetiva, ou seja, prescinde de comprovação de culpa ou dolo, e solidária em
decorrência da lei, nos termos do art. 7º, parágrafo único, da lei 8078/90,
entre todos os integrantes da cadeia de consumo (cabendo apenas ressaltar que
há exceção do comerciante, que possui responsabilidade subsidiaria nos termos
do art. 13 do CDC).
Partindo-se dessa
premissa, é possível estabelecer que o direito perante o consumidor deve ser
satisfeito por um, alguns ou todos os devedores solidários, e contra ele não
cabe discussão acerca da subjetividade da responsabilidade civil (não se
discute a culpa).
Após a satisfação do
crédito do consumidor, os fornecedores condenados solidariamente podem discutir
regressão internamente, a fim de apurar de quem foi o culpa no ato ilícito
ensejador de reparação civil. Essa ação regressiva poderá ser proposta
autonomamente ou poderá prosseguir nos próprios autos, nos termos do art. 88 do
CDC. Vale observar que referido artigo dispõe em sua literalidade que a ação
regressiva nos mesmos autos é uma faculdade atribuída apenas ao comerciante
que, caso condenado em sua responsabilidade subsidiária, poderá regredir contra
os demais fornecedores, mas a jurisprudência e a doutrina têm entendido haver
esta possibilidade para todos os integrantes da cadeia de consumo, em
conformidade com o princípio constitucional da celeridade processual.
No que concerne ao quantum, cada fornecedor será responsabilizado na ação de regresso,
analisando-se a culpa de cada um deles, na medida de sua colaboração no ato
ilícito, sendo plenamente possível a condenação de apenas um, alguns ou todos
(igualmente ou na proporção de sua contribuição e grau de culpa da conduta
praticada – nos últimos 2 casos).
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