ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso de Pós-Graduação “Lato
Sensu” – Especialização em Direito do Consumidor
MÓDULO 2 - Seminário 13, de 26/06/2014
DANO MATERIAL NO CDC
1. Como
o direito básico do consumidor à reparação dos danos materiais deve influenciar
a análise do prejuízo material experimentado pelo consumidor? Como estabelecer
os danos emergentes? E os lucros cessantes?
O direito básico do consumidor que
visa à reparação dos danos materiais sofridos está prevista no artigo 6º, VI do
CDC e deve ser analisada sob o binômio prevenção/reparação, ou seja, há de
verificar o quanto o ato ilícito foi prevenido pelo fornecedor para que não
ocorresse e a posterior verificação das consequências sofridas para correta
reparação.
A reparação dos danos materiais
experimentados pelo consumidor deve englobar os danos emergentes e os lucros
cessantes da seguinte forma:
Para a apuração do dano emergente deve-se verificar aquilo
que o consumidor sofreu com a prática ilícita do fornecedor, considerando,
portanto, aquilo que perdeu de maneira direta e aquilo que despendeu para
reparar o dano sofrido.
Já para a apuração do lucro cessante, é possível considerar a
quantia que o consumidor percebia e, por consequência do ilícito sofrido,
deixou de receber, e também a quantia não recebida, mas que se receberia e que
só não ocorreu em razão do ilícito praticado.
2. É possível a inversão do ônus da prova nos
seguintes pontos: a) a existência do dano material e b) extensão do dano
material?
Estabelece o art. 6º, VIII, do CDC que constitui direito
básico do consumidor a facilitação da defesa dos seus direitos em juízo,
inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor.
A doutrina passou a tender para um conceito ampliativo de
hipossuficiência, abrangente não apenas da situação de insuficiência ou fraqueza
econômica, mas de uma situação de inferioridade ou desvantagem em geral do
consumidor perante o fornecedor.
A hipossuficiência do consumidor pode decorrer do seu
desconhecimento acerca de aspectos relacionados com a elaboração de produtos e
a realização de serviços, ou, ainda, da extrema dificuldade de produzir prova.
A inferioridade do consumidor em relação ao fornecedor,
assim, decorrerá, muitas vezes, da desigualdade existente quanto à detenção dos
conhecimentos técnicos inerentes à atividade deste.
No flagrante desequilíbrio da relação entre consumidor
e fornecedor ainda que consumidor seja pessoa abastada economicamente e de bom
nível intelectual e cultural, talvez lhe seja impossível produzir tal prova,
porque somente o fornecedor tem pleno conhecimento do projeto, da técnica e do
processo utilizado.
Em assim sendo, por dispor de melhores condições de
demonstrar a inocorrência do vício ou defeito de fabricação, ao fornecedor deve
ser atribuído o ônus da prova.
Por esse prisma, entendemos que é possível a inversão do ônus
da prova na existência e extensão do dano material. Importante ressaltar, que
existem casos concretos em que a inversão do ônus da prova não caberá ao
fornecedor de serviços ou produtos e sim ao consumidor.
Para uma melhor análise é preciso estar diante do caso
concreto, via de regra, sabemos como já dito, que o consumidor é a parte mais
fraca da relação, entretanto há situações onde na relação de consumo, não
caberá ao fornecedor de serviços ou produtos a prova e sim ao consumidor, como
exemplo, podemos citar: o extravio de bagagem, ou a utilização de cofres em
hotéis e bancos.
Nestes casos, apenas como ilustração, o consumidor terá que
fazer prova do que havia dentro do cofre do hotel, do banco ou até mesmo de sua
bagagem, senão estaríamos diante de um novo desequilíbrio, desta vez sendo o
fornecedor a parte mais fraca.
Claro que o serviço ou produto deve ser apresentado conforme
o que foi prometido e contratado, ninguém espera que sua bagagem seja
extraviada, que o cofre de seu quarto no hotel seja furtado ou ainda que o banco
perca seus bens, como joias, por exemplo, mas a prova do que estaria dentro
deles, caberá neste caso ao consumidor e não ao fornecedor, que não teria
nestas situações como provar o que estava ou não dentro destes locais, cabendo
sim a reparação ao consumidor pelos danos sofridos, porém mediante prova por
parte deste.
3. Analisar
a fixação das verbas moratórias e indenização nos seguintes pontos:
a) juros de mora em danos contratuais e
extracontratuais;
b) correção monetária;
c) multa moratória;
d) multa compensatória; e
e) ressarcimento de honorários advocatícios
contratuais.
a) juros de mora em danos contratuais e extracontratuais: Inicialmente,
cumpre nos destacar que os juros de mora serão fixados, independente de terem
sido requeridos na petição inicial ou mesmo da sua fixação na sentença. Quanto
à fixação e incidência dos juros de mora divergem no caso dos danos
provenientes de contrato estabelecido entre as partes (danos contratuais) ou
danos provenientes de situações em que não há contrato estabelecido entre as
partes (danos extracontratuais).
Isso porque, os juros moratórios
correrão a partir do evento danoso, em se tratando de responsabilidade
extracontratual, ou seja, quando não há contrato entre as partes, nos termos do
artigo 398 do Código Civil e da Súmula 54 do STJ.
Já no caso de responsabilidade
contratual, ou seja, quando houve um contrato estabelecido entre as partes, se
a obrigação for líquida os juros serão contados a partir do vencimento, nos
termos do artigo 397, do Código Civil, se a obrigação for ilíquida, os juros
moratórios correrão a partir da citação, de acordo com a norma estabelecida no
artigo 405 do Código Civil e da Súmula 163 do STF.
b) correção monetária: A correção
monetária nada mais é do que a atualização da moeda e sua incidência será
diversa em caso de dano material e dano moral. Isso porque, em se tratando de
dano material, a incidência da correção monetária se dará a partir do efetivo
prejuízo, nos termos da Súmula 43, do STJ. Com relação à correção monetária nos
casos de dano moral, o termo inicial para a incidência da atualização monetária
é a data em que foi arbitrado seu valor, “tendo-se em vista que, no momento da
fixação do ‘quantum’ indenizatório, o magistrado leva em consideração a
expressão atual de valor da moeda”, nos termos da Súmula 362, do STJ.
c) multa
moratória: Nas relações de consumo, o descumprimento - ainda
que parcial - das obrigações a termo implica na incidência de multa moratória
na ordem de 2% sobre o valor da prestação vencida, consoante preconiza o § 1º
do art. 52 do CPC; dispositivo alterado por força da Lei nº 9.298/96, tendo em
vista que, antes de seu advento, a multa contratual era fixada na ordem de 10%.
Cumpre observar que a multa moratória é devida nas
hipóteses em que se dá a inexecução de cláusula contratual ou a simples mora do
obrigado, ou seja, quando se configura o inadimplemento relativo, aquele que
ainda é útil e proveitoso ao credor. Sua finalidade é evitar o pagamento em
atraso, na medida em que será exigida juntamente com o valor da prestação.
Extrai-se do magistério de Sílvio de Salvo Venosa
as seguintes considerações acerca da multa moratória:
“Aqui, por
sua natureza, a prestação sempre será útil para o credor. A multa atua como
efeito intimidativo, para que o devedor não atrase o cumprimento de sua avença.
Se o fizer, pagará a prestação de forma mais onerosa. É claro, também, que
mesmo na multa moratória, existe uma forma de compensação para o credor, que
recebe sua prestação tardiamente; no entanto, não é essa a natureza essencial
da multa moratória. A questão principal nesse tema é que, pela própria natureza
da cláusula penal moratória, não há que se confundir com a compensatória.” (Teoria
Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos - Direito Civil 3. ed.,
Atlas)
d) multa
compensatória: Por sua vez, a multa compensatória ou cláusula
penal é exigível quando ocorre o inadimplemento total da obrigação, ou seja,
nas hipóteses em que não mais é possível a purgação da mora e o cumprimento da
obrigação deixa de oferecer utilidade ao credor.
Esta situação não é acolhida pelo já citado art.
52, § 1º, do CDC, de modo que implica na observância das disposições contidas
nos artigos 408 e seguintes do Código Civil.
Objetiva ressarcir o lesado pela quebra contratual.
Diante disso, pode ser caracterizada como uma modalidade de indenização
pré-estabelecida no contrato.
De acordo com o art. 410 do CC o descumprimento
integral da obrigação confere ao credor a possibilidade de referida cláusula
penal ser convertida em seu benefício. Contudo, ao contrário do que ocorre com
a multa moratória, sua exigência afasta o cumprimento da obrigação original, ou
seja, será cobrada a multa compensatória, que pode atingir o montante
equivalente a 100% do valor do contrato ou se exige o adimplemento da obrigação
em si.
Novamente, na mesma obra acima indicada, Sílvio de
Salvo Venosa completa:
“...o
credor pode pedir o valor da multa ou o cumprimento da obrigação. Escolhida uma
via, não pode o credor também exigir a outra. O devedor, pagando a multa, nada
mais deve, porque ali já está fixada antecipadamente uma indenização pelo
descumprimento da obrigação. Se a prestação não tem mais utilidade para o
credor, só lhe restará cobrar a multa.”.
e) ressarcimento de honorários advocatícios contratuais: À luz do
artigo 395 do CC verifica-se a existência de direito ao ressarcimento dos
valores despendidos pela parte vencedora na contratação de advogado para sua
defesa. Pelo princípio da reparação integral o dispositivo é claro em tratar
como dano material os valores despendidos para ajuizamento de demanda a que deu
causa o réu. Não é matéria pacificada, porque algumas decisões judiciais são no
sentido de que a expressão “honorários advocatícios” do texto do artigo 395 do
Código Civil diz respeito aos sucumbenciais e não aos contratuais, negando, por
isso, o pedido de ressarcimento. Já o STJ reconheceu em Recurso Especial que: “Aquele
que deu causa ao processo deve restituir os valores despendidos pela outra
parte com honorários contratuais, que integram o valor devido a título de
perdas e danos, nos termos dos arts. 389, 395 e 404 do CC/02.”, Resp
1.134.725, Relatora Ministra Nancy Andrighi, j. 14.06.2011, DJE de 24.06.2011.
Portanto, embora ainda não exista esse hábito, cabe aos advogados incluir os
honorários que contrataram com seus clientes nas petições iniciais das ações de
cobrança das obrigações, a título de danos materiais.
4. Analisar
os acórdãos das Apelações nº 0008981-64.2012.8.26.0562 e 1001356-52.2013.8.26.0068.
Analisar a aplicação “invertida” (nada mais do que a “interpretação extensiva”)
da “cláusula penal”. Se prevista cláusula penal apenas para a mora do
consumidor ou para o inadimplemento do consumidor, poderá ser aplicada em
relação ao fornecedor? Como será a aplicação, se a mora está prevista em 2%
para o atraso na prestação em dinheiro e a obrigação do fornecedor
corresponder, por exemplo, à entrega de um imóvel ou de um automóvel?
Os acórdãos das Apelações nº
0008981-64.2012.8.26.0562 e 1001356-52.2013.8.26.0068 trazem a interpretação
jurisprudencial acerca da aplicação invertida da cláusula penal. Isto é, para a
jurisprudência consumerista, havendo previsão de cláusula penal caso haja o
inadimplemento do consumidor, deve-se estender a aplicação ao fornecedor na
ocorrência de sua mora. Ou seja, mesmo que não haja expressa previsão
contratual de multa para o descumprimento da obrigação celebrada pelo
fornecedor, caso exista previsão de multa para o consumidor, dever-se-á
aplicá-la também ao fornecedor. No
exemplo ventilado, caso a mora prevista para a prestação seja de 2% e
verifique-se esta situação do fornecedor, este deverá o mesmo percentual sobre
o bem imóvel ou móvel ao consumidor. A fundamentação utilizada pela
jurisprudência é basicamente a de se reequilibrar a relação entre consumidor e
fornecedor em razão do contrato ser bilateral, oneroso, comutativo e
sinalagmático.
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