quarta-feira, 20 de agosto de 2014

SEMINÁRIO 13 - MÓD. II - DANO MATERIAL NO CDC

ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” – Especialização em Direito do Consumidor
MÓDULO 2 - Seminário 13, de 26/06/2014
DANO MATERIAL NO CDC

1. Como o direito básico do consumidor à reparação dos danos materiais deve influenciar a análise do prejuízo material experimentado pelo consumidor? Como estabelecer os danos emergentes? E os lucros cessantes?

O direito básico do consumidor que visa à reparação dos danos materiais sofridos está prevista no artigo 6º, VI do CDC e deve ser analisada sob o binômio prevenção/reparação, ou seja, há de verificar o quanto o ato ilícito foi prevenido pelo fornecedor para que não ocorresse e a posterior verificação das consequências sofridas para correta reparação.
           
A reparação dos danos materiais experimentados pelo consumidor deve englobar os danos emergentes e os lucros cessantes da seguinte forma:

Para a apuração do dano emergente deve-se verificar aquilo que o consumidor sofreu com a prática ilícita do fornecedor, considerando, portanto, aquilo que perdeu de maneira direta e aquilo que despendeu para reparar o dano sofrido.

Já para a apuração do lucro cessante, é possível considerar a quantia que o consumidor percebia e, por consequência do ilícito sofrido, deixou de receber, e também a quantia não recebida, mas que se receberia e que só não ocorreu em razão do ilícito praticado.

2.  É possível a inversão do ônus da prova nos seguintes pontos: a) a existência do dano material e b) extensão do dano material?

Estabelece o art. 6º, VIII, do CDC que constitui direito básico do consumidor a facilitação da defesa dos seus direitos em juízo, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor.

A doutrina passou a tender para um conceito ampliativo de hipossuficiência, abrangente não apenas da situação de insuficiência ou fraqueza econômica, mas de uma situação de inferioridade ou desvantagem em geral do consumidor perante o fornecedor.

A hipossuficiência do consumidor pode decorrer do seu desconhecimento acerca de aspectos relacionados com a elaboração de produtos e a realização de serviços, ou, ainda, da extrema dificuldade de produzir prova.

A inferioridade do consumidor em relação ao fornecedor, assim, decorrerá, muitas vezes, da desigualdade existente quanto à detenção dos conhecimentos técnicos inerentes à atividade deste.

No flagrante desequilíbrio da relação entre consumidor e fornecedor ainda que consumidor seja pessoa abastada economicamente e de bom nível intelectual e cultural, talvez lhe seja impossível produzir tal prova, porque somente o fornecedor tem pleno conhecimento do projeto, da técnica e do processo utilizado.

Em assim sendo, por dispor de melhores condições de demonstrar a inocorrência do vício ou defeito de fabricação, ao fornecedor deve ser atribuído o ônus da prova.

Por esse prisma, entendemos que é possível a inversão do ônus da prova na existência e extensão do dano material. Importante ressaltar, que existem casos concretos em que a inversão do ônus da prova não caberá ao fornecedor de serviços ou produtos e sim ao consumidor.

Para uma melhor análise é preciso estar diante do caso concreto, via de regra, sabemos como já dito, que o consumidor é a parte mais fraca da relação, entretanto há situações onde na relação de consumo, não caberá ao fornecedor de serviços ou produtos a prova e sim ao consumidor, como exemplo, podemos citar: o extravio de bagagem, ou a utilização de cofres em hotéis e bancos.

Nestes casos, apenas como ilustração, o consumidor terá que fazer prova do que havia dentro do cofre do hotel, do banco ou até mesmo de sua bagagem, senão estaríamos diante de um novo desequilíbrio, desta vez sendo o fornecedor a parte mais fraca.

Claro que o serviço ou produto deve ser apresentado conforme o que foi prometido e contratado, ninguém espera que sua bagagem seja extraviada, que o cofre de seu quarto no hotel seja furtado ou ainda que o banco perca seus bens, como joias, por exemplo, mas a prova do que estaria dentro deles, caberá neste caso ao consumidor e não ao fornecedor, que não teria nestas situações como provar o que estava ou não dentro destes locais, cabendo sim a reparação ao consumidor pelos danos sofridos, porém mediante prova por parte deste.

3.  Analisar a fixação das verbas moratórias e indenização nos seguintes pontos:
a) juros de mora em danos contratuais e extracontratuais;
b) correção monetária;
c) multa moratória;
d) multa compensatória; e
e) ressarcimento de honorários advocatícios contratuais.

a) juros de mora em danos contratuais e extracontratuais: Inicialmente, cumpre nos destacar que os juros de mora serão fixados, independente de terem sido requeridos na petição inicial ou mesmo da sua fixação na sentença. Quanto à fixação e incidência dos juros de mora divergem no caso dos danos provenientes de contrato estabelecido entre as partes (danos contratuais) ou danos provenientes de situações em que não há contrato estabelecido entre as partes (danos extracontratuais).
Isso porque, os juros moratórios correrão a partir do evento danoso, em se tratando de responsabilidade extracontratual, ou seja, quando não há contrato entre as partes, nos termos do artigo 398 do Código Civil e da Súmula 54 do STJ.
Já no caso de responsabilidade contratual, ou seja, quando houve um contrato estabelecido entre as partes, se a obrigação for líquida os juros serão contados a partir do vencimento, nos termos do artigo 397, do Código Civil, se a obrigação for ilíquida, os juros moratórios correrão a partir da citação, de acordo com a norma estabelecida no artigo 405 do Código Civil e da Súmula 163 do STF.

 b) correção monetária: A correção monetária nada mais é do que a atualização da moeda e sua incidência será diversa em caso de dano material e dano moral. Isso porque, em se tratando de dano material, a incidência da correção monetária se dará a partir do efetivo prejuízo, nos termos da Súmula 43, do STJ. Com relação à correção monetária nos casos de dano moral, o termo inicial para a incidência da atualização monetária é a data em que foi arbitrado seu valor, “tendo-se em vista que, no momento da fixação do ‘quantum’ indenizatório, o magistrado leva em consideração a expressão atual de valor da moeda”, nos termos da Súmula 362, do STJ.

c) multa moratória: Nas relações de consumo, o descumprimento - ainda que parcial - das obrigações a termo implica na incidência de multa moratória na ordem de 2% sobre o valor da prestação vencida, consoante preconiza o § 1º do art. 52 do CPC; dispositivo alterado por força da Lei nº 9.298/96, tendo em vista que, antes de seu advento, a multa contratual era fixada na ordem de 10%.

Cumpre observar que a multa moratória é devida nas hipóteses em que se dá a inexecução de cláusula contratual ou a simples mora do obrigado, ou seja, quando se configura o inadimplemento relativo, aquele que ainda é útil e proveitoso ao credor. Sua finalidade é evitar o pagamento em atraso, na medida em que será exigida juntamente com o valor da prestação.

Extrai-se do magistério de Sílvio de Salvo Venosa as seguintes considerações acerca da multa moratória:
“Aqui, por sua natureza, a prestação sempre será útil para o credor. A multa atua como efeito intimidativo, para que o devedor não atrase o cumprimento de sua avença. Se o fizer, pagará a prestação de forma mais onerosa. É claro, também, que mesmo na multa moratória, existe uma forma de compensação para o credor, que recebe sua prestação tardiamente; no entanto, não é essa a natureza essencial da multa moratória. A questão principal nesse tema é que, pela própria natureza da cláusula penal moratória, não há que se confundir com a compensatória.” (Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos - Direito Civil 3. ed., Atlas)

d) multa compensatória: Por sua vez, a multa compensatória ou cláusula penal é exigível quando ocorre o inadimplemento total da obrigação, ou seja, nas hipóteses em que não mais é possível a purgação da mora e o cumprimento da obrigação deixa de oferecer utilidade ao credor.

Esta situação não é acolhida pelo já citado art. 52, § 1º, do CDC, de modo que implica na observância das disposições contidas nos artigos 408 e seguintes do Código Civil.
Objetiva ressarcir o lesado pela quebra contratual. Diante disso, pode ser caracterizada como uma modalidade de indenização pré-estabelecida no contrato.

De acordo com o art. 410 do CC o descumprimento integral da obrigação confere ao credor a possibilidade de referida cláusula penal ser convertida em seu benefício. Contudo, ao contrário do que ocorre com a multa moratória, sua exigência afasta o cumprimento da obrigação original, ou seja, será cobrada a multa compensatória, que pode atingir o montante equivalente a 100% do valor do contrato ou se exige o adimplemento da obrigação em si.

Novamente, na mesma obra acima indicada, Sílvio de Salvo Venosa completa:
“...o credor pode pedir o valor da multa ou o cumprimento da obrigação. Escolhida uma via, não pode o credor também exigir a outra. O devedor, pagando a multa, nada mais deve, porque ali já está fixada antecipadamente uma indenização pelo descumprimento da obrigação. Se a prestação não tem mais utilidade para o credor, só lhe restará cobrar a multa.”.

e) ressarcimento de honorários advocatícios contratuais: À luz do artigo 395 do CC verifica-se a existência de direito ao ressarcimento dos valores despendidos pela parte vencedora na contratação de advogado para sua defesa. Pelo princípio da reparação integral o dispositivo é claro em tratar como dano material os valores despendidos para ajuizamento de demanda a que deu causa o réu. Não é matéria pacificada, porque algumas decisões judiciais são no sentido de que a expressão “honorários advocatícios” do texto do artigo 395 do Código Civil diz respeito aos sucumbenciais e não aos contratuais, negando, por isso, o pedido de ressarcimento. Já o STJ reconheceu em Recurso Especial que: “Aquele que deu causa ao processo deve restituir os valores despendidos pela outra parte com honorários contratuais, que integram o valor devido a título de perdas e danos, nos termos dos arts. 389, 395 e 404 do CC/02.”, Resp 1.134.725, Relatora Ministra Nancy Andrighi, j. 14.06.2011, DJE de 24.06.2011. Portanto, embora ainda não exista esse hábito, cabe aos advogados incluir os honorários que contrataram com seus clientes nas petições iniciais das ações de cobrança das obrigações, a título de danos materiais.

4. Analisar os acórdãos das Apelações nº 0008981-64.2012.8.26.0562 e 1001356-52.2013.8.26.0068. Analisar a aplicação “invertida” (nada mais do que a “interpretação extensiva”) da “cláusula penal”. Se prevista cláusula penal apenas para a mora do consumidor ou para o inadimplemento do consumidor, poderá ser aplicada em relação ao fornecedor? Como será a aplicação, se a mora está prevista em 2% para o atraso na prestação em dinheiro e a obrigação do fornecedor corresponder, por exemplo, à entrega de um imóvel ou de um automóvel?

Os acórdãos das Apelações nº 0008981-64.2012.8.26.0562 e 1001356-52.2013.8.26.0068 trazem a interpretação jurisprudencial acerca da aplicação invertida da cláusula penal. Isto é, para a jurisprudência consumerista, havendo previsão de cláusula penal caso haja o inadimplemento do consumidor, deve-se estender a aplicação ao fornecedor na ocorrência de sua mora. Ou seja, mesmo que não haja expressa previsão contratual de multa para o descumprimento da obrigação celebrada pelo fornecedor, caso exista previsão de multa para o consumidor, dever-se-á aplicá-la  também ao fornecedor. No exemplo ventilado, caso a mora prevista para a prestação seja de 2% e verifique-se esta situação do fornecedor, este deverá o mesmo percentual sobre o bem imóvel ou móvel ao consumidor. A fundamentação utilizada pela jurisprudência é basicamente a de se reequilibrar a relação entre consumidor e fornecedor em razão do contrato ser bilateral, oneroso, comutativo e sinalagmático. 

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