quarta-feira, 20 de agosto de 2014

SEMINÁRIO 15 - MÓD. II - DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO NO CDC

ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” – Especialização em Direito do Consumidor
MÓDULO 2 - Seminário 15, de 7/8/2014
Decadência e Prescrição no CDC

1.                  Quais são as diferenças fundamentais entre os institutos da prescrição e da decadência no Código de Defesa do Consumidor?

R:
Prescrição
Decadência
- Está prevista no art. 27 do CDC;
- Prevista no art. 26 do CDC;
- Atinge a pretensão à reparação;
- Atinge o próprio direito;
- Conta-se o prazo do conhecimento do dano e de sua autoria;
- Há previsão de 2 (dois) prazos decadenciais, da constatação do vício aparente:
> Produtos duráveis: 90 dias;
> Produtos não duráveis: 30 dias;
- A prescrição se aplica ao fato do produto ou serviço (acidente de consumo);
- Decadência se aplica ao vício do produto ou serviço;
- A prescrição requer um direito já exercido pelo titular, mas que tenha sofrido algum obstáculo dando origem à violação daquele direito.
- A decadência supõe um direito em potencial afetado.

2.                  Qual o sentido da expressão “obstam a decadência” constante do art. 26, §2º, do Código de Defesa do Consumidor? Há ou não consideração do prazo transcorrido antes da hipótese legal que obstou a decadência?

R: O § 2º do artigo 26 do CDC dispõe que a instauração de inquérito civil até seu encerramento e a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor de produtos e serviços, até resposta negativa transmitida de forma inequívoca "obstam" a decadência.

Dessa afirmação (“obstar”), formou-se uma corrente que hoje vem sendo amplamente aplicada, dispondo que o prazo disposto no artigo 26 é decadencial, mas que, como prazos dessa natureza não podem ser suspensos, ou interrompidos, aplicar-se-ia, analogicamente, o artigo 27 do CDC ou a regra geral do artigo 206 do Código Civil, o que for mais benéfico para o consumidor. O prazo, portanto, será integralmente devolvido ao consumidor.


3.                  Havendo hipótese de prazo mais vantajoso ao consumidor em legislação esparsa ou no Código Civil é possível sua aplicação em detrimento do prazo constante do Código de Defesa do Consumidor? Em sendo possível, existe possibilidade da utilização dos mandamentos legais do Código de Defesa do Consumidor e também da outra fonte Legislativa em diálogo das fontes ou estaria excluída a possibilidade de aplicação do CDC em optando por outro sistema?

R: Entendemos que, sempre que for mais benéfico para o consumidor será possível a utilização de artigos previstos em outras leis que não seja o CDC. Isto porque a própria norma protetiva ao consumidor prevê, em seu artigo 7º (Art. 7° - Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e equidade.”), o diálogo das fontes.

Ensina Fabrício Bolzan: “A expressão ‘diálogo’ decorre exatamente da relação de influência recíprocas que se estabelece entre normas como critério de melhor solucionar eventuais conflitos e com o objetivo de proteger o vulnerável da relação jurídica de consumo.”.

“Estando respaldado o Direito do Consumidor por um Direito Fundamental Constitucional, com maior razão é necessário buscar a conformação da aplicação de todas as leis existentes, sem exclusão de qualquer delas.” (‘Direito do Consumidor Esquematizado’ – 2ª edição – Ed. Saraiva – p. 44).

4.                  Ocorrendo, como é comum, danos por fato e vício do produto ou serviço (ou vício de qualidade por inadequação e insegurança) no mesmo evento, as disposições dos artigos 26 e 27 do Código de Defesa do Consumidor são aplicadas conjuntamente ou há absorção de um sistema pelo outro?

R: Ocorrendo danos por fato do produto e vício do produto/serviço no mesmo momento, aplicar-se-á a norma mais benéfica ao consumidor, ou seja, a disposição de maior prazo absorverá a do prazo inferior.

5.                  É possível falar-se em decadência para acidentes de consumo (fato do produto ou serviço)?                                

R: Embora haja doutrina extensa sobre os institutos da decadência e da prescrição e alguma divergência jurisprudencial, constata-se que o não reconhecimento do prazo decadencial para o fato do produto ou do serviço é de caráter formal. Ou seja, o legislador estatuiu na norma o prazo decadencial para o exercício do direito de reclamar (direito subjetivo) do consumidor apenas nos casos de vício do produto ou do serviço, conforme o art. 26, do CDC.

Nesse sentido, o lapso temporal para o exercício do direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação é de 30 (trinta) dias para o fornecimento produtos ou serviços não duráveis e de 90 (noventa) dias para os considerados duráves, tendo como início da contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução do serviço, conforme o Art. 26, do CDC

E, na inteligência do Art. 27, do CDC é que o legislador tratou dos acidentes de consumo – fato do produto ou do serviço, segundo o qual estabeleceu o prazo prescricional de 5 (cinco) anos para a pretensão à reparação pelos danos causados, iniciando a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.

Por fim, é certo que os casos de acidente de consumo ocorrem, na grande maioria, posteriormente à entrega efetiva do produto ou do término da execução do serviço, razão pela qual o legislador talvez tenha optado em adotar o prazo prescricional de 5 (cinco) anos, a fim de viabilizar as condições para que o consumidor pudesse pretender a reparação dos danos materiais e morais, não importando os prazos estabelecidos de 30 e 90 dias do art. 26, do CDC.

Temos como exemplo de não reconhecimento da decadência, conforme o excerto do julgado abaixo:

  
Número do processo: 2.0000.00.479416-3/000/TJ-MG/2005 - Relator: TARCÍSIO MARTINS COSTA -
EMENTA: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - DECADÊNCIA - RESPONSABILIDADE POR FATO DO PRODUTO OU SERVIÇO - APLICABILIDADE DO ART. 27 DO CDC - PROVA NECESSÁRIA À ELUCIDAÇÃO DA CONTROVÉRSIA - INDEFERIMENTO - CERCEAMENTO DE DEFESA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO
_________________________________________________________________
O SR. DESEMBARGADOR TARCÍSIO MARTINS COSTA:
Cuida-se de agravo de instrumento interposto contra a r. decisão de fl. 185, proferida pela MM. Juíza da 1ª Vara Cível da Comarca de Teófilo Otoni, que, nos autos da ação de indenização movida por Maria Aparecida de Oliveira em face de Primo Schincariol Indústria de Cervejas e Refrigerantes do Rio de Janeiro S.A., rejeitou a preliminar de decadência, bem como indeferiu o pedido de perícia a ser realizada na lata de cerveja onde teria sido encontrado o réptil, motivo pelo que ajuizou a ação.
Irresignada, pretende a agravante a reforma do r. decisum, sustentando, em suma, que se trata de reparação por danos decorrentes de vício do produto e não de fato do produto ou serviço, pelo que deve se aplicar à espécie o artigo 26, I, do Código Consumerista, reconhecendo-se a decadência e, via de consequência, extinguindo o processo com julgamento do mérito, nos moldes do art. 269IV, do CPC.
Alega que a realização de perícia na lata de cerveja, onde supostamente teria sido encontrada a "lagartixa" é de extrema importância para o esclarecimento das dúvidas existentes, além de seu indeferimento implicar em vulneração aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.
Deferida a formação e o processamento do agravo, foi denegada a suspensividade vindicada (fl. 191).
Contraminuta às fl. 194-200, em evidente infirmação, pugnando pelo desprovimento do recurso.
Conhece-se do recurso, presentes os pressupostos que regem sua admissibilidade
...”Extrai-se dos autos que, em 09.09.2002, a agravada ajuizou ação em face da agravante buscando obter indenização por danos morais que diz ter suportado em decorrência do consumo de produto por esta fabricado - cerveja em lata - que conteria um pequeno réptil, vulgarmente conhecido como "lagartixa".
Regularmente citada, a agravante apresentou contestação requerendo, preliminarmente, o reconhecimento da decadência, com base no art. 26 do Código Consumerista e, posteriormente, ao ensejo da especificação de provas, a realização de perícia técnica na lata defeituosa, bem como na linha de produção de cerveja.
A digna Juíza da causa, analisando os pedidos, deixou de acolher a preliminar, por entender que não se trata de reclamação por vício do produto ou serviço, mas sim por fato do produto, aplicando-se ao caso o disposto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, bem como considerou prejudicada a realização de perícia, dado o extenso decurso de tempo entre o evento danoso e o ajuizamento da ação principal. Essa a decisão agravada.
Quanto à prejudicial de decadência, tenho que merece ser mantida a r. razão atacada.
É que o art. 26 da Lei 8.078/90 cuida das hipóteses de vícios do produto ou serviço, o que não é o caso, devendo ser aplicado à espécie o art. 27 do mesmo diploma legal que trata da reparação pelos danos causados pelo fato do produto ou serviço.
Há, portanto, que se distinguir o que o Código de Defesa do Consumidor assentou chamar de "responsabilidade pelo fato do produto ou serviço", prevista nos arts. 12 a 17, que não se confunde com a "responsabilidade pelo vício do produto ou serviço", regulada nos artigos 18 a 25 da lei consumerista.
A responsabilidade pelo fato do produto ou serviço decorre da exteriorização de um defeito, não só capaz de frustrar a legítima expectativa do consumidor quanto a sua fruição, mas também que lhe pode causar riscos à saúde e à incolumidade física, tratando-se de vício de qualidade que gera insegurança, implicando um acidente de consumo.”...


6.                  Cada grupo deverá escolher um acórdão para comentar durante os debates.          

R: Acórdão escolhido: Antônio Moreno x Banco do Brasil
Apelação nº 0026001-65.2008.8.26.0576 – Comarca de São José do Rio Preto
Autor ingressou com ação no Juizado Especial Cível em face do Banco do Brasil por conta de débitos automáticos de conta de eneriga elétrica, não autorizados, em sua conta corrente, em nome de terceiros, que ocorriam desde 1°/3/1997 e se estenderam até dia 31/05/2003.

O banco réu alegou decadência e, também, a não aplicabilidade das normas consumeristas ao fato.

O autor, por seu turno, pediu a condenação do réu por danos materiais e morais.

O Juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedente o pedido do autor, condenando o réu pelos danos materiais, a serem restituídos de maneira simples e não condenando pelos morais, por entender que os descontos ocorridos na conta corrente do autor não passaram de mero transtorno.

O banco apelou requerendo a reforma da sentença que o condenou à indenização de danos materiais, sob o argumento de que ocorreu a decadência; já o autor ingressou com recurso adesivo requerendo a condenação do réu pelos danos morais.

Foram apreciadas as teses apelativas:
Reconheceu-se tratar-se típica relação jurídica de consumo envolvendo instituição financeira, um banco, e um consumidor, pessoa física, conforme preceituam os arts. 2° e 3° do CDC (v. Adin. 2591 e Súmula 297 – STJ).

Não ocorreu a decadência, porque não há vício do produto, uma vez que produto algum foi adquirido. Trata-se, sim, de fato do serviço, uma vez que objetiva a reparação dos danos suportados. Sendo assim, o instituto aplicável é o da prescrição, com prazo de 5 anos, contados da data em que o autor teve conhecimento do dano e da sua autoria (teoria da “actio nata”), nos exatos termos do art. 27, do CDC.

O marco inicial, então, para a contagem da prescrição, foi em 1º/7/2003, quando o autor tomou conhecimento do evento danoso e pediu o cancelamento do débito automático. A pretensão do autor surgiu a partir dessa data e se estendeu até julho de 2008. A ação foi ajuizada dentro desse prazo, em 14.05.2008, faltando quase dois meses para a ocorrência da prescrição.


No mérito foi julgado o apelo, conferindo ao autor a indenização por danos morais (R$ 12.000,00), uma vez que houve ofensa aos direitos de personalidade e confirmando a sentença quanto aos danos materiais (R$ 7.891,66), entretanto, a restituição deverá ser em dobro e corrigida, nos termos do art. 42, do CDC.

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