ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso de Pós-Graduação “Lato
Sensu” – Especialização em Direito do Consumidor
MÓDULO 2 - Seminário 16, de 14/8/2014
Garantia legal e Contratual e
Excludentes de Responsabilidade Civil no CDC
1.
Havendo
garantia legal (CDC, art. 24) e garantia contratual (CDC, art. 50), os prazos das
garantias correm simultaneamente ou sucessivamente?
O
consumidor possui prazo para realizar reclamação referente aos
produtos/serviços adquiridos, sendo que para o defeito aparente ou de fácil
constatação (produtos riscados, com mau funcionamento), o prazo é de 30 dias
para bens ou serviços não duráveis e de 90 dias para bens ou serviços duráveis.
A
contagem do prazo tem início a partir da efetiva entrega do produto ou,
tratando-se de serviço, após sua total execução. Exceto quando se tratar de
vício oculto, pois neste caso o prazo será computado a partir do conhecimento
deste.
Vale
lembrar que em tais prazos estão elencados no Código de Defesa do Consumidor e
representam prazos de “garantia legal”, ou seja, aquela que é gratuita, pois
decorre da lei e não pode em hipótese alguma ser afastada, pois é vedada a
exoneração contratual do fornecedor (Art. 24, do CDC).
Existe
também a “garantia contratual”, que é complementar à garantia legal e é
estipulada pelo próprio fornecedor, que não tem essa obrigação, mas, assumindo
a responsabilidade, deve cumpri-la. Ela deve ser firmada mediante termo
escrito, com definição das limitações e restrições do direito desta garantia
(Art. 50, Parágrafo Único, do CDC).
Segundo a Ministra Nancy Andriguie e o entendimento
majoritário da jurisprudência e doutrina, a garantia contratual não engloba a
legal, devendo sim ser acrescida, sendo
os prazos contados sucessivamente de modo que deve-se esgotar primeiramente o
prazo da garantia contratual e só depois dar início à contagem do prazo da
garantia legal. Caso o fornecedor livremente estipule o prazo de 1 ano
de garantia contratual, ela corresponderá a 1 ano + 90 dias, para bens
duráveis, ou 30 dias, para não duráveis
1.
Cuidando-se produto adquirido no exterior (p. ex. celular, veículo)
e havendo fornecedor do mesmo grupo instalado no Brasil, responde este pela garantia
legal? E pela contratual?
Na
aquisição de produtos do exterior, pelo consumidor, sem intervenção de
terceiros (importadores),
o fato, por si só, da existência de fornecedor do mesmo grupo no Brasil, não
impõe qualquer obrigatoriedade
ao fornecedor nacional de responder pelos vícios em tais produtos, não é
condição apta a integrar tal fornecedor no rol solidário de responsabilidade,
vinculada à garantia legal.
A
Lei de Consumo, que inegavelmente possui como ingrediente de sua receita, o
fator costume, também por isto, restringe sua abrangência aos produtos
produzidos no território brasileiro, pois, em regra, a legislação do país
estrangeiro, amolda-se às peculiaridades de seu povo, divergindo,
necessariamente, da nossa legislação, tornando assim, apenas os produtos
adquiridos no território brasileiro, ainda que importados, alvos da garantia
legal.
Quanto
à garantia contratual, considera-se válida sua abrangência no território
brasileiro, somente se, o contrato original contemplar a previsão de tal
cobertura especificamente no território brasileiro, principalmente pela
obediência às formalidades exigidas a tal garantia, consoante regra do Código
de Defesa do Consumidor:
Art.
50 . A garantia contratual é complementar à legal e será conferida mediante
termo escrito.
Parágrafo
único: O termo de garantia ou equivalente deve ser padronizado e esclarecer, de
maneiro adequada, em que consiste a mesma garantia, bem como a forma, o prazo e
o lugar em que pode ser exercitada... (g.n.)
Ocorre
que, muitos posicionamentos recentes tem admitido a aplicação da garantia
contratual, mesmo que essa não tenha sido expressamente delimitada no contrato,
ou seja, se não houver qualquer exclusão no sentido da cobertura internacional,
o representante da marca no Brasil teria que garantir aquele produto, pois se
ele tem o bônus de comercializar a marca, também teria que ter o ônus de
garantir o produto adquirido pelo consumidor.
2.
Cuidando-se de vício oculto, qual é o prazo máximo a ser
considerado para a permanência da garantia legal do fornecedor? Seria aplicável
o disposto no art. 445, p. 1°, do Código Civil? Seria aplicável o disposto no
art. 27 do CDC? Haveria outro critério para busca do prazo máximo? P. ex., qual
seria o prazo máximo de responsabilidade pela garantia legal no caso de vício
oculto na venda de uma geladeira? E de um veículo?
Cuidando-se de vício oculto, qual é o prazo máximo a ser
considerado para a permanência da garantia legal do fornecedor? O prazo
máximo a ser considerado para a permanência da garantia legal do fornecedor é a
vida útil do produto, ou seja, deve se analisar qual o tempo de durabilidade do
referido produto para verificar o prazo da garantia legal. Seria aplicável o disposto no art. 445, p. 1°, do Código
Civil? O disposto no art. 445, 01º é aplicável nas hipóteses de
vício oculto e estaria ligada a esfera extrajudicial. No entanto, com o advento
da lei consumerista, passou a se utilizar o Código de Defesa do Consumidor para
contabilizar os prazos que esses teriam para solicitar a aplicação da garantia
legal ou contratual. Seria aplicável o disposto no art. 27 do CDC? O artigo 27 seria aplicável na
esfera judicial, bpois se refere a um prazo prescricional, com o fim de que o
consumidor busque a reparação pelos danos decorrentes de defeitos nos produtos
ou serviço. Haveria outro critério para busca do prazo
máximo? Sim. A doutrina consumerista – sem desconsiderar a existência de
entendimento contrário – tem entendido que o CDC, no §3º do art. 26, no que
concerne à disciplina do vício oculto, adotou o critério da vida útil do bem, e
não o critério da garantia, podendo o fornecedor se responsabilizar pelo vício
em um espaço largo de tempo, mesmo depois de expirada a garantia contratual.
Assim, independentemente do prazo contratual de garantia, a venda de um bem
tido por durável com vida útil inferior àquela que legitimamente se esperava,
além de configurar um defeito de adequação (art. 18 do CDC), evidencia uma quebra
da boa-fé objetiva, que deve nortear as relações contratuais, sejam elas de
consumo, sejam elas regidas pelo direito comum. Precedente: REsp 1.123.004-DF,
DJe 9/12/2011. REsp 984.106-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em
4/10/2012.
EMENTA: Quarta Turma - DIREITO DO CONSUMIDOR. VÍCIO OCULTO.
DEFEITO MANIFESTADO APÓS O TÉRMINO DA GARANTIA CONTRATUAL. OBSERVÂNCIA DA VIDA
ÚTIL DO PRODUTO.
Resposta à pergunta: Por exemplo, qual seria o prazo máximo de responsabilidade pela garantia legal no caso de vício oculto na venda de uma geladeira? E de um veiculo? A análise do caso concreto será o melhor caminho a ser adotado pelo juiz, pois não há como se determinar quanto tempo de vida útil certo produto terá. Está é a lição de José Carlos Maldonado de Carvalho: “De fato, dúvidas não há de que o critério de vida útil do produto ou do serviço, cujo prazo venha a ser fixado, no caso concreto, pelo juiz, de acordo com as regras ordinárias de experiência, melhor atende aos interesses dos consumidores, sempre a parte mais fraca na relação de consumo”.
Todavia, o juiz pode se pautar
pela Instrução Normativa SRF nº 162 de 31/12/1998 que fixa o prazo de vida útil
e a taxa de depreciação dos bens a qual pode ser consultada sítio eletrônico da
Receita Federal no endereço: http://www.receita.fazenda.gov.br/Legislacao/ins/Ant2001/1998/in16298ane1.htm,
acesso feito em 21.08.2014. Da leitura dessa Instrução, verifica-se que a vida
útil de um refrigerador é de 10 (dez) anos, enquanto que a de um veículo
automotor para transporte de pessoas é de 5 (cinco) anos.
3.
A chamada "garantia estendida" por meio da qual o
estabelecimento comercial, por certo valor, concede um prazo de garantia superior
à garantia legal e contratual, encerraria prática abusiva frente aos
mandamentos do Código de Defesa do Consumidor? O comerciante responde pela
garantia legal e contratual?
Não, a
Garantia Estendida é um tipo de seguro, regulamentado pela SUSEP (Superintendência
de Seguros Privados), que tem por finalidade complementar a garantia do produto
ou estender (ampliar) essa garantia. Desta forma, a primeira coisa a observar é
se o seguro que está sendo oferecido, chamado de Garantia Estendida, é do tipo
que estende a garantia dada pelo fabricante ou complementa essa garantia.
Ocorre
que, muitas vezes, essa garantia não é fornecida de forma adequada ao
consumidor, pois os fornecedores incluem tal seguro no valor de venda do
produto, sem oferecer dar a opção ao consumidor para adquirir ou não tal
seguro.
Outra
prática abusiva muito comum no mercado de varejo é a venda casada deste
serviço, pois o fornecedor oferece um desconto, mas a condição para concessão
do referido desconto é a contratação do referido seguro.
Quanto á
responsabilidade do comerciante, o artigo 13, do CDC, determina que o
comerciante responderá pelo fato do produto ou serviço quando, o fabricante, o
construtor, o produtor e o importador não puderem ser identificados, o produto
for fornecido sem identificação clara ou quando não conservar adequadamente os
produtos tidos como perecíveis.
Desta
feita, conclui-se que o comerciante poderá ser responsabilizado pela garantia
legal e contratual, nas hipóteses acima elencadas.
4.
Quais as excludentes de responsabilidade civil admitida no CDC?
Mantendo o fim precípuo de proteção e defesa ao
consumidor, o CDC ao tratar da reparação de danos adota à responsabilidade
daqueles que fornecem produtos ou executam serviços, a prescindibilidade da
existência de culpa, ou seja, a responsabilidade objetiva. Esta regra comporta
exceção quando se enfrenta questões atinentes ao profissional liberal, como se
vê do § 4º do art. 14 (“A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais
será apurada mediante a verificação de culpa.”).
O Código de Defesa do Consumidor é expresso ao
estabelecer as causas que excluem a responsabilidade do fornecedor em reparar
eventuais danos ao consumidor.
São aquelas previstas no § 3º, incisos I a III do
artigo 12 (1), ao tratar de fato do produto, bem como as descritas nos incisos
I e II do § 3º do artigo 14(2), que discorre acerca do serviço.
Portanto, em se tratando de questões
consumeristas, possível afirmar que as excludentes de responsabilidade civil
são as taxativamente previstas nos dispositivos acima indicados.
Não se cogita abrigar a tese de que o CDC poderia
acolher os institutos do caso fortuito, força maior e até mesmo da culpa
concorrente. Isto, porque, de acordo com os argumentos já esposados, o rol de
excludentes é restrito na legislação consumerista e inexiste previsão para sua
incidência, conforme defendem alguns doutrinadores.
Tampouco poderia se adotar o espírito constante
do artigo 7º do CDC, que justifica o emprego de outros ordenamentos a facilitar
a preservação dos direitos dos consumidores, tendo em vista que, consoante o
texto do dispositivo legal em evidência, a aplicação de outras normas e fontes
de direito são destinadas apenas à satisfação do “direito” dos consumidores e
não sua limitação; circunstância que afasta a possibilidade de discussão acerca
de caso fortuito, força maior e culpa concorrente em questões consumeristas.
Considerações sucintas acerca das excludentes
previstas no CDC:
Da não colocação do produto no mercado - aqui há
uma presunção legal no sentido de se reconhecer que o produto foi inserido no
mercado de consumo pelo fornecedor. Ocorre que esta presunção pode ser ilidida
através de provas, com o objetivo de, se o caso, comprovar a ocorrência de
roubo ou furto do produto defeituoso, desde que não tenha se caracterizado a
culpa “in vigilando” ou “in elegendo”.
De igual modo, caso comprovada a falsificação de
produto introduzido na cadeia de consumo, poderá se reconhecer a excludente.
Quanto à inexistência do defeito indicado pelo
consumidor e que teria provocado o dano alegado, o fabricante, produtor,
construtor ou importador não respondem se houver prova inequívoca de que aquele
produto não possui qualquer defeito hábil de lesionar o consumidor.
No que diz respeito à culpa exclusiva da vítima
ou mesmo de terceiro, se restar apurada não haverá nexo de causalidade entre o
dano sofrido e a atividade praticada pelo fornecedor do produto ou serviço.
Aqui se abraça a excludente decorrente do uso inadequado ou negligente do
produto, a não obediência às instruções de uso, a entrega do produto a
terceiro, sem as devidas recomendações ou mesmo o consumo de produto com
validade vencida após sua aquisição.
Da mesma forma, se o serviço adquirido não for
utilizado de acordo com as orientações fornecidas e esta situação gerar
qualquer espécie de dano, isento estará o fornecedor de qualquer
responsabilidade.
(1) Art. 12 O fabricante,
o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem,
independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos
consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção,
montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus
produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua
utilização e riscos.
§ 3° O fabricante, o
construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando
provar:
I - que não colocou o produto no mercado;
II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;
III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
(2) Art. 14 O
fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela
reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à
prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas
sobre sua fruição e riscos.
§ 3° O fornecedor de
serviços só não será responsabilizado quando provar:
I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II - a culpa exclusiva do consumidor ou de
terceiro.
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