ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” -
Especialização em Direito do Consumidor
Módulo 3 - Seminário 20, de 25/9/2014
OFERTA E CONTRATO DE CONSUMO
1. Apontar as diferenças
entre o CC de 2.002 e o CDC na disciplina da oferta? No contrato de consumo, as
ofertas de um corretor de seguro (de automóvel) e de um corretor de plano de
saúde integram o contrato? (usualmente, o fornecedor afirma que o corretor é
representante do consumidor).
NO CC:
·
O CC regulamenta a proposta;
·
Inexiste vinculação do fornecedor;
·
Admite o não prevalecimento da proposta em algumas situações;
·
Público alvo: empresários e comerciantes
NO CDC:
·
O CDC regulamenta a oferta;
·
Vinculação do fornecedor presente na oferta;
·
Prevê a impossibilidade da revogação da oferta nas relações de
consumo;
·
Público
alvo: consumidores
As
ofertas de um corretor de seguro e de um corretor de plano de saúde integram o
contrato que vier a ser celebrado, ainda que não conste formalmente do
contrato, nele deverá constar o teor da oferta.
Daí
surge a cautela de se guardar panfletos da oferta distribuídos no mercado de
consumo, na medida em que todas as informações, se suficientemente precisas e
veiculadas, obrigam o fornecedor pelo princípio da vinculação da oferta, de
modo que ficam integradas ao contrato de consumo.
2. Quais os requisitos para a vinculação
do fornecedor à oferta? Como integrar a oferta ao contrato de consumo (examinar
as hipóteses de conflito entre oferta e contrato e de interpretação do contrato
à luz da oferta)?
Reza o artigo 30 do CDC que “toda informação ou publicidade,
suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação
com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o
fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que
vier a ser celebrado”.
A informação ou publicidade deverá atender a três requisitos,
quais sejam:
1º Quem oferta?
2º O que oferta?
3º Qual o preço da oferta?
Se não houver resposta para pelo menos uma das três perguntas, não
haverá vinculação da informação ou oferta ao fornecedor.
Após isso é preciso avaliar outro requisito. Trata-se da
informação ou publicidade que deverá ser suficientemente precisa, isto é, sem
exagero (puffing). É o caso de expressões exageradas como “o melhor
sabor”, “o mais bonito”, “o maravilhoso”.
Contudo, dependendo do contexto em que vier ser veiculada, poderá
vincular o fornecedor, como por exemplo, os que dizem respeito a preços (“o
melhor preço da capital”, “a garantia mais completa do mercado”), pois o
exagero, nesse caso, indicará precisão. Não é, então, qualquer informação ou
publicidade que vincula o fornecedor. Tem que ser precisa, mas não
absolutamente precisa. Tanto é que o Código se contenta com uma precisão
suficiente, vale dizer, com um mínimo de concisão que é sempre analisada em
relação ao destinatário da oferta. Havendo potencial persuasivo, já não mais
estamos diante de simples exagero.
Podemos exemplificar a publicidade realizada pelas Casas Bahia em
que o garoto propaganda pergunta ao telespectador “Quer pagar quanto?”
Passando à verificação das três perguntas, notamos que a primeira
e a segunda são certamente respondidas, pois sabemos quem é o anunciante e o
que oferta. Falta o terceiro requisito, ou seja, não se tem o preço do produto.
Foi deixado ao livre arbítrio do consumidor. Neste caso, a publicidade não foi
capaz de, precisamente, criar vínculo, por faltar este último requisito. Mas, o
que se tem notícia, é de que as Casas Bahia pagou o preço sugerido por alguns
consumidores e logo retirou a propaganda do ar para evitar complicações
judiciais.
Diz o final do artigo 30 do CDC que a informação ou publicidade
“obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o
contrato que vier a ser celebrado.” (grifo nosso).
A melhor doutrina e jurisprudência reconhecem ser normal que se dê
à publicidade um valor contratual. Dessa forma a oferta que obrigar o
fornecedor integrará o contrato que vier a ser celebrado como parte do
instrumento contratual.
Havendo conflito entre oferta e contrato, ou seja, quando o
contrato eventualmente celebrado pretender afastar a oferta, deverá prevalecer
a proposta publicitária em detrimento do contrato, por puro respeito ao
princípio da informação que rege as relações de consumo e pela própria
determinação do comando do artigo 30 do CDC.
A interpretação contratual à luz da oferta deverá ser de tal forma
que favoreça o consumidor, em respeito aos princípios da vulnerabilidade (art.
4º, I, CDC), da boa-fé (art. 4º, III, CDC), da hipossuficiência (art. 6º, VIII,
CDC), da transparência (art. 4º, “caput”, CDC) e da informação (art. 4º, IV,
CDC).
3. Uma oferta publicitária (TV, RÁDIO,
JORNAL) pode vincular o fornecedor? Matéria paga pelo fornecedor (que disfarça
uma publicidade) e aparenta ser uma reportagem dá ensejo à aplicação do artigo
30 do CDC?
Sim, em regra, toda forma de publicidade, seja por qualquer meio,
desde que possua informação pormenorizada e completa, cumprindo os requisitos
do art. 30 e 31, do Código Consumerista, o qual estabelece que para vincular o
fornecedor a publicidade deverá ser suficiente e precisa. Além disso, estabelece
o art. 4º, III, do CDC que a oferta deverá ser certa e verdadeira de modo a
viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170,
CF/88), zelando sempre pela boa-fé e o equilíbrio nas relações entre
consumidores e fornecedores.
Quanto ao fornecedor que tenta disfarçar uma publicidade em forma
de reportagem, sim pode haver a vinculação, caso seja de forma incisiva
demasiadamente a sua exibição, podendo ensejar à celebração de uma oferta.
No entanto, essa técnica é chamada de “anúncio camaleão” ou
“publicidade nativa” que aparecem em geral em blogs e também em portais. O
leitor mais atento consegue identificar esse tipo de publicidade, mas com o
advento da alta tecnologia fica cada vez mais difícil identificar que uma
reportagem disfarça ali uma publicidade.
Tempos atrás o CONAR e o PROCON tiveram que intervir em uma
situação em que publicidades eram disfarçadas principalmente em blogs de moda.
Prontamente os Órgãos proibiram a veiculação exigindo que as publicidades devem
ser claras o suficiente para o pronto entendimento do consumidor.
Infelizmente, essa é uma prática que está sendo utilizada
comumente no Brasil e precisa ser sempre coibida pelos Órgãos competentes, a
fim de não prejudicar os consumidores em geral.
4. Examinar o acórdão da Apelação nº
994.07.118338-0 - voto vencedor e voto vencido. Explicar cada posição à luz da
oferta no CDC, sustentando, ao final, qual seria aquela escolhida pelo grupo -
não se descartando uma terceira posição.
No julgamento da apelação nº 994.07.118338-0, o Desembargador
Relator Sebastião Carlos Garcia se posicionou favoravelmente à vinculação da
oferta difundida em meio eletrônico - site - que dispunha sobre a possibilidade
de utilização do ‘meio de transporte mais adequado’ para os serviços de remoção
dos pacientes segurados.
Por outro lado, na divergência proferida pelo Desembargador Vito
Guglielmi, entendeu-se inadmissível a almejada remoção nos termos solicitados.
Sustenta a necessária observância à autonomia da manifestação de vontades ante
a ausência de previsão contratual para remoção na forma pretendida (“O Poder
Judiciário não pode criar obrigações contratuais inexistentes.” - voto
divergente).
Contudo, ao analisarmos o caso concreto, entendemos imprescindível
a vinculação da oferta exposta na página de internet da companhia de seguro,
possibilitando, assim, a remoção na forma que melhor atenda a necessidade da
enferma. Aplicar-se-á o disposto no art. 35, inciso I, do CDC. O transporte
aéreo era medida indispensável dada a gravidade do seu estado de saúde.
Sequer podemos interpretar de forma restritiva a cláusula
contratual sobre a comprovação da necessidade. É o caso de privilegiar, como
determina a norma consumerista, a parte mais fraca da relação que, nesse caso,
é a enferma segurada. Com isso, de rigor a aplicação do art. 47 do CDC para que
a previsão contratual acerca da cobertura de remoção mediante transporte aéreo
seja interpretada como comprovadamente necessária, não porque o atendimento hospitalar
na cidade de Salvador não possui o tratamento devido, mas pelo fato de a
paciente se encontrar fora de seu domicílio, o que implica na necessária
continuidade de seu tratamento junto a seu ambiente e próximo dos seus entes.
Portanto, acompanhamos o entendimento esposado no voto vencedor,
de modo que a publicidade vinculou o fornecedor do serviço, pois se valeu de
uma publicidade genérica e irrestrita, com o intuito de atrair consumidores
para seus serviços.
Entender de forma diversa acarretaria inadmissível desequilíbrio
entre as partes, o que fere os princípios da legislação consumerista.
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