sábado, 7 de março de 2015

SEMINÁRIO 20 - MÓD III - OFERTA E CONTRATO DE CONSUMO

ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” - Especialização em Direito do Consumidor
Módulo 3 - Seminário 20, de 25/9/2014
OFERTA E CONTRATO DE CONSUMO


1. Apontar as diferenças entre o CC de 2.002 e o CDC na disciplina da oferta? No contrato de consumo, as ofertas de um corretor de seguro (de automóvel) e de um corretor de plano de saúde integram o contrato? (usualmente, o fornecedor afirma que o corretor é representante do consumidor).

        NO CC:
·         O CC regulamenta a proposta;
·         Inexiste vinculação do fornecedor;
·         Admite o não prevalecimento da proposta em algumas situações;
·         Público alvo: empresários e comerciantes

NO CDC:
·         O CDC regulamenta a oferta;
·         Vinculação do fornecedor presente na oferta;
·         Prevê a impossibilidade da revogação da oferta nas relações de consumo;
·         Público alvo: consumidores



As ofertas de um corretor de seguro e de um corretor de plano de saúde integram o contrato que vier a ser celebrado, ainda que não conste formalmente do contrato, nele deverá constar o teor da oferta.

Daí surge a cautela de se guardar panfletos da oferta distribuídos no mercado de consumo, na medida em que todas as informações, se suficientemente precisas e veiculadas, obrigam o fornecedor pelo princípio da vinculação da oferta, de modo que ficam integradas ao contrato de consumo.

2. Quais os requisitos para a vinculação do fornecedor à oferta? Como integrar a oferta ao contrato de consumo (examinar as hipóteses de conflito entre oferta e contrato e de interpretação do contrato à luz da oferta)?

Reza o artigo 30 do CDC que “toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado”.  

A informação ou publicidade deverá atender a três requisitos, quais sejam:

1º Quem oferta?
2º O que oferta?
3º Qual o preço da oferta?

Se não houver resposta para pelo menos uma das três perguntas, não haverá vinculação da informação ou oferta ao fornecedor.

Após isso é preciso avaliar outro requisito. Trata-se da informação ou publicidade que deverá ser suficientemente precisa, isto é, sem exagero (puffing). É o caso de expressões exageradas como “o melhor sabor”, “o mais bonito”, “o maravilhoso”.

Contudo, dependendo do contexto em que vier ser veiculada, poderá vincular o fornecedor, como por exemplo, os que dizem respeito a preços (“o melhor preço da capital”, “a garantia mais completa do mercado”), pois o exagero, nesse caso, indicará precisão. Não é, então, qualquer informação ou publicidade que vincula o fornecedor. Tem que ser precisa, mas não absolutamente precisa. Tanto é que o Código se contenta com uma precisão suficiente, vale dizer, com um mínimo de concisão que é sempre analisada em relação ao destinatário da oferta. Havendo potencial persuasivo, já não mais estamos diante de simples exagero.

Podemos exemplificar a publicidade realizada pelas Casas Bahia em que o garoto propaganda pergunta ao telespectador “Quer pagar quanto?”

Passando à verificação das três perguntas, notamos que a primeira e a segunda são certamente respondidas, pois sabemos quem é o anunciante e o que oferta. Falta o terceiro requisito, ou seja, não se tem o preço do produto. Foi deixado ao livre arbítrio do consumidor. Neste caso, a publicidade não foi capaz de, precisamente, criar vínculo, por faltar este último requisito. Mas, o que se tem notícia, é de que as Casas Bahia pagou o preço sugerido por alguns consumidores e logo retirou a propaganda do ar para evitar complicações judiciais.

Diz o final do artigo 30 do CDC que a informação ou publicidade “obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.” (grifo nosso).

A melhor doutrina e jurisprudência reconhecem ser normal que se dê à publicidade um valor contratual. Dessa forma a oferta que obrigar o fornecedor integrará o contrato que vier a ser celebrado como parte do instrumento contratual.

Havendo conflito entre oferta e contrato, ou seja, quando o contrato eventualmente celebrado pretender afastar a oferta, deverá prevalecer a proposta publicitária em detrimento do contrato, por puro respeito ao princípio da informação que rege as relações de consumo e pela própria determinação do comando do artigo 30 do CDC.

A interpretação contratual à luz da oferta deverá ser de tal forma que favoreça o consumidor, em respeito aos princípios da vulnerabilidade (art. 4º, I, CDC), da boa-fé (art. 4º, III, CDC), da hipossuficiência (art. 6º, VIII, CDC), da transparência (art. 4º, “caput”, CDC) e da informação (art. 4º, IV, CDC).

3. Uma oferta publicitária (TV, RÁDIO, JORNAL) pode vincular o fornecedor? Matéria paga pelo fornecedor (que disfarça uma publicidade) e aparenta ser uma reportagem dá ensejo à aplicação do artigo 30 do CDC?

Sim, em regra, toda forma de publicidade, seja por qualquer meio, desde que possua informação pormenorizada e completa, cumprindo os requisitos do art. 30 e 31, do Código Consumerista, o qual estabelece que para vincular o fornecedor a publicidade deverá ser suficiente e precisa. Além disso, estabelece o art. 4º, III, do CDC que a oferta deverá ser certa e verdadeira de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, CF/88), zelando sempre pela boa-fé e o equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores.

Quanto ao fornecedor que tenta disfarçar uma publicidade em forma de reportagem, sim pode haver a vinculação, caso seja de forma incisiva demasiadamente a sua exibição, podendo ensejar à celebração de uma oferta.

No entanto, essa técnica é chamada de “anúncio camaleão” ou “publicidade nativa” que aparecem em geral em blogs e também em portais. O leitor mais atento consegue identificar esse tipo de publicidade, mas com o advento da alta tecnologia fica cada vez mais difícil identificar que uma reportagem disfarça ali uma publicidade.

Tempos atrás o CONAR e o PROCON tiveram que intervir em uma situação em que publicidades eram disfarçadas principalmente em blogs de moda. Prontamente os Órgãos proibiram a veiculação exigindo que as publicidades devem ser claras o suficiente para o pronto entendimento do consumidor.

Infelizmente, essa é uma prática que está sendo utilizada comumente no Brasil e precisa ser sempre coibida pelos Órgãos competentes, a fim de não prejudicar os consumidores em geral.

4. Examinar o acórdão da Apelação nº 994.07.118338-0 - voto vencedor e voto vencido. Explicar cada posição à luz da oferta no CDC, sustentando, ao final, qual seria aquela escolhida pelo grupo - não se descartando uma terceira posição.

No julgamento da apelação nº 994.07.118338-0, o Desembargador Relator Sebastião Carlos Garcia se posicionou favoravelmente à vinculação da oferta difundida em meio eletrônico - site - que dispunha sobre a possibilidade de utilização do ‘meio de transporte mais adequado’ para os serviços de remoção dos pacientes segurados.

Por outro lado, na divergência proferida pelo Desembargador Vito Guglielmi, entendeu-se inadmissível a almejada remoção nos termos solicitados. Sustenta a necessária observância à autonomia da manifestação de vontades ante a ausência de previsão contratual para remoção na forma pretendida (“O Poder Judiciário não pode criar obrigações contratuais inexistentes.” - voto divergente).

Contudo, ao analisarmos o caso concreto, entendemos imprescindível a vinculação da oferta exposta na página de internet da companhia de seguro, possibilitando, assim, a remoção na forma que melhor atenda a necessidade da enferma. Aplicar-se-á o disposto no art. 35, inciso I, do CDC. O transporte aéreo era medida indispensável dada a gravidade do seu estado de saúde.

Sequer podemos interpretar de forma restritiva a cláusula contratual sobre a comprovação da necessidade. É o caso de privilegiar, como determina a norma consumerista, a parte mais fraca da relação que, nesse caso, é a enferma segurada. Com isso, de rigor a aplicação do art. 47 do CDC para que a previsão contratual acerca da cobertura de remoção mediante transporte aéreo seja interpretada como comprovadamente necessária, não porque o atendimento hospitalar na cidade de Salvador não possui o tratamento devido, mas pelo fato de a paciente se encontrar fora de seu domicílio, o que implica na necessária continuidade de seu tratamento junto a seu ambiente e próximo dos seus entes.

Portanto, acompanhamos o entendimento esposado no voto vencedor, de modo que a publicidade vinculou o fornecedor do serviço, pois se valeu de uma publicidade genérica e irrestrita, com o intuito de atrair consumidores para seus serviços.


Entender de forma diversa acarretaria inadmissível desequilíbrio entre as partes, o que fere os princípios da legislação consumerista. 

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