quinta-feira, 19 de março de 2015

SEMINÁRIO 24 - MÓD. III - CLÁUSULAS ABUSIVAS

ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” – Especialização em Direito do Consumidor
Módulo 3 - Seminário 24, de 23/10/2014
CLÁUSULAS ABUSIVAS

1.                  Buscar três exemplos concretos de cláusulas que podem ser qualificadas como abusivas, nos contratos de consumo por vocês celebrados ou encontrados na Internet: a) seguro (de vida, residencial ou veículo), b) cartão de crédito, c) seguro ou plano de saúde, d) contracorrente bancária, e) compromisso de compra e venda de imóvel, f) prestação de serviços de telefonia celular ou fixa, g) TV a cabo, etc.
R: Para a solução da questão proposta serão analisadas três espécies dos contratos indicados: 1. contrato de seguro saúde; 2. compromisso de compra e venda de imóvel; 3. contrato de abertura de conta corrente.
1. SEGURO OU PLANO DE SAÚDE.
a) Limitação temporal nos casos de internação. Esta estipulação contratual representa afronta ao art. 12, inciso II, da Lei nº 9.656/98, bem como ao teor da Súmula nº 302 do STJ (“É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a internação hospitalar do segurado.”)
b) Negativa de cobertura de doenças e procedimentos. Para os contratos de seguro saúde firmados após o advento da Lei nº 9.656, de 03.06.1998 há regulação jurídica acerca do tema, com limitação expressa acerca das coberturas permitidas nas contratações. Dúvida surge para os contratos celebrados antes da vigência da Lei 9.656/98. Nestes casos, o CDC apresenta solução mediante a proibição às cláusulas abusivas previstas em seu art. 51. Com isso, prevalece o entendimento que permite a cobertura de tratamento às doenças catalogadas no Cadastro Internacional de Doenças, tendo em vista que os contratos de plano de saúde são considerados cativos, de trato sucessivo.
c) Suspensão ou rescisão contratual de forma arbitrária. Novamente, a Lei nº 9.656/98 apresenta solução para esta conduta das operadoras de plano de saúde. Há impedimento expresso acerca da suspensão da cobertura em casos de não pagamento no prazo inferior a sessenta (60) dias, seguidos ou não, durante o período de doze (12) meses; circunstância que exige a notificação prévia ao segurado no 50º dia da inadimplência.
De igual modo, fica vedada a suspensão da cobertura durante o período de internação do usuário.
2. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL.
a) Perda integral das prestações pagas. O artigo 53 do CDC proíbe estipulação contratual que permita a perda total dos valores pagos pelo compromissório comprador em favor do credor que “em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado.”
b) Incidência de multa contratual abusiva. A previsão contratual de multa por descumprimento em índice superior a 2% deve ser afastada para que seja observado o limite previsto no § 2º do artigo 52 do CDC.
c) Exigência de custos administrativos. Qualquer cobrança a título de despesas administrativas – usualmente na ordem de 4% - deve ser rechaçada, posto que abusiva. Na prática, a abusividade só é detectada após o pagamento, oportunidade em que poderá ser objeto de discussão judicial com o intuito de obter a repetição do valor pago indevidamente.
3. CONTRATO DE CONTA CORRENTE.
a) Venda casada. A contratação de serviços juntamente com a abertura de conta corrente, tal como seguro de vida, representam afronta ao disposto no art. 39, inc. I, do CDC e deve ser extirpado do negócio.
b) Rescisão unilateral pela instituição financeira. A concessão de limite de crédito (cheque especial) junto à conta corrente fica à critério do banco. Entretanto, na hipótese de cancelamento ou redução do limite concedido, compete à instituição financeira a notificação prévia e em prazo razoável acerca de tal conduta, sob pena de violar o direito de informação (art. 6º, inc. III, do CDC). Cumpre ressaltar que, em eventual litígio judicial, ao banco recairá o ônus da prova acerca da comunicação clara e precisa ao consumidor, consoante art. 6º, inc. VIII, do CDC.
c) Apropriação de valores. De igual modo é vedada a retenção de valores pertencentes ao correntista para pagamento de débitos junto ao banco; notadamente, se forem vencimentos trabalhistas, diante de sua natureza alimentar e proteção constitucional. Nestes casos, a instituição financeira deve se valer dos meios processuais adequados para satisfação de seu crédito, não se admitindo a cobrança arbitrária.
2.                  A súmula 381 do STJ (“Nos contratos bancário, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, a abusividade das cláusulas”) é aplicável a outros contratos de consumo?
R: Controvertida a questão. Embora haja disposição legal possibilitando o reconhecimento, de ofício, de cláusula abusiva nos contratos de consumo, entendemos que, embora grande parte da jurisprudência venha reconhecendo “ex officio” a abusividade de cláusulas contratuais de cunho consumerista, deve-se respeitar o devido processo legal, a segurança jurídica, dentre outros princípios basilares do nosso ordenamento. Consignamos que o MM. Juízo deve se limitar ao que foi deduzido inicialmente, apreciando apenas o que expressamente constar nos autos.
Por outro lado, o entendimento majoritário é de que a Súmula 318 do STJ se restringe aos contratos bancários. Há ainda quem entenda que até mesmo nos contratos bancários, nos casos em que a abusividade resulte em nulidade absoluta, pode-se afastar a aplicabilidade da aludida súmula.
3.                  Quando se analisa a iniquidade de uma obrigação do consumidor ou de uma vantagem do fornecedor, quais os elementos a serem considerados? Apenas econômicos?
R: Ao se analisar uma obrigação decorrente de relação do consumo deve-se partir dos princípios basilares da lei 8078/90.
A relação, que deve ser fundada na boa-fé e na informação, pode ser analisada para eventual revisão sob o prisma da hipossuficiência do consumidor, que engloba não só a econômica, mas também a fragilidade técnica, jurídica e informacional.
4.                  É possível aplicar-se o CDC aos contratos entre empresas, a partir do conceito de consumidor do artigo 29 do CDC, quando utilizado um instrumento de adesão? Será possível analisar-se o contrato à luz do artigo 51 do CDC?
R: Preliminarmente, é relevante ressaltar que, em regra, pessoas jurídicas não são consideradas consumidoras pelo CDC tendo em vista que adquirem produtos ou contratam serviços com o objetivo de auferirem lucros; logo, não são destinatários finas (Art. 3º, §§ 1 e 2 CDC).
Nesse sentido, a lógica dos contratos interempresariais é diferente dos contratos de consumo e, nas demandas entre empresas, o Código Consumerista é utilizado, excepcionalmente, quando outros ramos do direito (Código Civil 2002 e a Lei Antitruste 1994, que coíbe a concorrência de forma desleal) não forem suficientes para corrigir os abusos praticados pelo contratante em posição de superioridade.
Ainda que seja o negócio jurídico realizado por contrato de adesão, segundo entendimento do STJ, ao verificar numa relação entre empresas uma real situação de comprovada e excessiva vulnerabilidade econômica, fática, técnica ou alguma forma de abuso em razão dessa dependência, equipara-os como consumidores visando o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, sua função social e a boa-fé objetiva, sendo a controvérsia sanada pelo art. 29, do CDC, pois o seu alcance é mais abrangente na proteção contra práticas comerciais abusivas.
Também como exceção o Tribunal aplica o Art. 51, CDC com respeito às cláusulas abusivas nos contratos de adesão, pois o Art. 424, do Código Civil Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio” mostra-se demasiadamente restrito por não abranger toda e qualquer relação jurídica entre profissionais.

Diante disso, o STJ a partir de 2004, apesar de ainda adotar uma postura conservadora acerca da Teoria Finalista, sensibilizou-se pelas várias jurisprudências construídas ao longo do tempo e relativizou a Teoria Finalista Clássica passando a adotar a Teoria Finalista Aprofundada ou Mitigada, pois se tornou latente a necessidade de se aumentar a tutela protetiva para uma justa análise do caso concreto nas relações entre sociedades empresariais.

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