ESCOLA
PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso
de Pós-Graduação “Lato Sensu” - Especialização em Direito do Consumidor
Módulo 3 -
Seminário 29, de 04/12/2014
CONTRATOS
BANCÁRIOS II
1) CONCEITO
DE VALOR RESIDUAL GARANTIDO. Qual a dinâmica do contrato de arrendamento
mercantil? O conceito e o alcance do VRG? O grupo deve analisar à luz do do
Direito do Consumidor a tese fixada para os efeitos do art. 543-C, do CPC: “Nas ações de reintegração de posse
motivadas por inadimplemento de arrendamento mercantil financeiro, quando o
produto da soma do VRG quitado com o valor da venda do bem for maior que o
total pactuado com VRG na contratação, será direito do arrendatário receber a
diferença, cabendo porém, estipulado no contrato, prévio desconto de outras
despesas ou encargos contratuais” (REsp nº 1.09.21-RJ, Segunda Seção do
STJ, Relator Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 27.02.2013).
R: Conceito
de VRG: O "Valor Residual Garantido" nas operações de arrendamento
mercantil ou leasing constitui-se em
uma garantia especial pago de forma
antecipada e independentemente do valor das prestações mensais e dos juros, em
favor da empresa arrendadora, caso o "arrendatário" não exerça sua
opção de compra ao final do contrato e, neste caso, o bem seria leiloado para
terceiros, vendido pela melhor oferta sem avaliação prévia e sem preço mínimo,
então o VRG serviria para garantir a lucratividade e a eliminação de qualquer
possibilidade de risco empresarial no negócio.
Podemos dizer que a dinâmica se dá em conformidade ao que aduz a Lei nº
6.099, de 1974, alterada pela Lei nº 7.132, de 1983, segundo a qual considera-se arrendamento mercantil, o negócio jurídico
realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física
ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o
arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da
arrendatária e para uso próprio desta (art. 1º, parágrafo único, da Lei
7.132, de 1983).
À luz do art. 543-C, do CPC, o grupo entende que, inobstante ainda haver
controvérsia entre entendimentos de tribunais estaduais sobre a devolução ou
não do VRG pago antecipadamente, nos casos de inadimplemento contratual por
parte da arrendatária, nas ações de reintegração de posse, vislumbra-se como o
mais ajustado o definido pelo STJ e que também o acompanha o TJSP “Ocorrida a resolução do contrato, com a
reintegração do bem na posse da arrendadora, possível a devolução ao
arrendatário dos valores pagos a título de VRG” (art. 5º, da Lei 6.099/74).
Ademais, conforme a Súmula 293/STJ, a cobrança antecipada do VRG não
descaracteriza o contrato de arrrendamento mercantil; logo; a arrendadora que
tem o objetivo precípuo e legítimo baseado no lucro, caso se negue a devolver a
diferença ao arrendatário quando o produto da soma do VRG quitado com o valor
da venda do bem for maior que o total pactuado como VRG, além de cobrar parcelas
ou alugueis vincendos, incorre em nítido desrespeito ao princípio da ordem
econômica que está assim consagrado no art. 170, V, da CF/88 e, via de
consequência, em enriquecimento ilícito.
2) TABELA
PRICE E CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. Há capitalização de juros na “Tabela Price”?
R: A utilização da Tabela
Price implica na prática de capitalização de juros, pois é de sua essência.
Para definir a Tabela Price, vale-se do magistério do matemático José Dutra Vieira
Sobrinho, ao citar o entendimento do Professor Mario Geraldo Pereira:
“a denominação Tabela Price se deve ao
matemático, filósofo e teólogo inglês Richard Price, que viveu no século XVIII
e que incorporou a teoria dos juros
compostos às amortizações de empréstimos (ou financiamentos). A
denominação “Sistema Francês”, de acordo com o autor citado, deve-se ao fato de
o mesmo ter-se efetivamente desenvolvido na França, no Século XIX. Esse sistema
consiste em um plano de amortização de uma dívida em prestações periódicas,
iguais e sucessivas, dentro do conceito de termos vencidos, em que o valor de
cada prestação, ou pagamento, é composto por duas parcelas distintas: uma de
juros e uma de capital (chamada amortização). (Mário Geraldo Pereira. Plano básico de amortização pelo sistema
francês e respectivo fator de conversão. Dissertação - Doutoramento - FCEA, São
Paulo, 1965)” [José Dutra Vieira Sobrinho. Matemática Financeira. São
Paulo, Atlas, 1998, p. 220]
Daí
conclui-se que a Tabela Price é um método de amortização que consiste na
aplicação de juros compostos (juros sobre juros ou capitalizados).
Outrossim,
se os juros não são pagos de forma integral na prestação mensal, o valor
excedente recai sobre o saldo devedor a ser calculado para a obtenção do valor
da próxima prestação mensal.
Com
o intuito de corroborar o entendimento de que a prática de juros capitalizados
decorre do emprego da Tabela Price, colaciona-se excertos da doutrina de Luiz
Antônio Scavone Junior:
“De fato, o problema fundamental da tabela
price diz respeito à exigibilidade dos juros. Nesse sistema, os juros são
recebidos sobre todo o capital acumulado e não sobre a parcela de capital
correspondente. Apenas o resíduo do valor da prestação total é utilizado para
amortização do capital”.
“Por conseguinte, o valor total pago a
título de juros suplanta aquele devido em razão dos juros capitalizados de
forma simples na exata medida em que a taxa é aplicada, a cada período, sobre
todo o capital” (pág. 215)
“Como na tabela price os juros são cobrados
por antecipação, tendo em vista a redação do art. 6º do Decreto 22.626/33, o
valor total desses juros não poderia suplantar mas suplanta aqueles que seriam
devidos em razão da capitalização simples aplicada às parcelas de capital
decompostas pelo prazo de pagamento.”
“Em suma, o ponto fundamental para
conclusão da proibição da tabela price pelo critério do art. 6º do Decreto
22.626/33, pode ser resumido no seguinte exemplo: o capital de R$ 100.000,00
pelo prazo de quinze anos a amortização mensais, iguais e sucessivas, com taxa
de juro de 1% ao mês, pela tabela price, equivalerá ao pagamento total, a
título de juros, de R$ 116.029,63.”
“Todavia, considerando uma 'série de
pagamentos', decompondo o mesmo capital em razão de idêntico prazo, o pagamento
total de juros importa em R$ 90.500,00.”
“Por outro lado, as parcelas obtidas pela
aplicação da tabela price correspondem à taxa de juros de 1,2821% ao mês, de
forma simples, incidindo sobre cada parcela de capital tendo em vista o prazo
para restituição.”
“Portanto, considerada a série de
pagamentos e a fórmula para obtenção do montante (valor futuro) com
capitalização simples sobre cada parcela de capital em razão do prazo, o
sistema francês oculta taxas de juros maiores que aquelas declaradas.”
“Em outras palavras, como a tabela price
antecipa os juros vincendos, acaba ocultando uma taxa maior de juros
capitalizados de forma simples.”
Em tese, esse fato configura o crime de
usura tipificado no art. 13 do Decreto 22.626/33, segundo o qual 'é considerado
delito de usura toda a simulação ou prática tendente a ocultar a verdadeira
taxa do juro ou a fraudar os dispositivos desta lei, para o fim de sujeitar o
devedor a maiores prestações ou encargos, além dos estabelecidos no respectivo
título ou instrumento'. Esse aspecto é evidente, evidentíssimo, aliás.” (JUROS
NO DIREITO BRASILEIRO, Ed. RT, 2ª edição, páginas 218/221).
Finalmente,
de tudo se conclui que a aplicação da Tabela Price se mostra contrária às
disposições do art. 4º, do Decreto-lei nº 22.626/33 (não revogado pela Lei nº
4.595/64), bem como ao que estabelece a Súmula nº 121 do E. STF.
3) PURGA DA MORA NA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. Qual o conceito de
alienação fiduciária? Qual a diferença entre a “alienação fiduciária” e o
“arrendamento mercantil”? O grupo deve analisar à luz do Direito do Consumidor
a tese fixada para os efeitos do artigo 543-C do CPC: “Nos contratos firmados na vigência da Lei n. 10.931/2004, compete ao
devedor, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar na ação de busca
e apreensão, pagar a integralidade da dívida –entendida esta com os valores
apresentados e comprovados pelo credor na inicial -, sob pena de consolidação
da propriedade do móvel objeto de alienação fiduciária.” (REsp nº
1.48.593/MS, Segunda Seção, relator o Ministro Luís Felipe Salomão, julgado em
14.5.2014)
R: I) A
alienação fiduciária consiste na transferência feita pelo devedor ao credor da
propriedade resolúvel e da posse indireta de um bem infungível (art. 1361, CC)
ou de um bem imóvel (Lei nº 9514/97, arts. 22 a 33), como garantia de seu
débito, resolvendo-se o direito do adquirente com o adimplemento da obrigação,
ou melhor, com o pagamento da dívida garantida. Constitui-se um direito real de
garantia.
II) Já o arrendamento mercantil (leasing) é o meio
pelo qual a pessoa jurídica ou física, visando a utilização de bem móvel
procede para que a instituição financeira adquira o bem e o alugue por prazo
determinado, estabelecendo que, ao término do prazo, possa escolher entre 3
(três) opções: devolução do bem, renovação da locação ou aquisição do bem. Uma
das principais diferenças se encontra na ausência de propriedade resolúvel no
arrendamento mercantil, além de ser instituto com maior complexidade, pois,
reúne pluralidade de relações de direito (locação, financiamento e compra e
venda). Já na alienação fiduciária, o fiduciante amortiza o débito a cada
prestação paga, não lhe restando qualquer valor residual ao tempo do
adimplemento.
III) A luz do que disciplina o Direito do
Consumidor, o Recurso Repetitivo - REsp n. 148.593-MS – em questão afronta os
dispositivos presentes na Lei nº 8.078/90. Determinar o pagamento integral da
dívida, no prazo máximo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar ação de
busca e apreensão, evidencia total abusividade do credor. O entendimento do STJ é prejudicial ao
consumidor, porque antes dessa decisão, os juízes aplicavam o posicionamento
que, com o pagamento das parcelas vencidas, era possível devolver a posse
direta do bem ao devedor e continuar a obrigação do ponto que estava. Com o
novo entendimento, os juízes estão aplicando a disposição literal da Lei 9.514/97,
determinando que para o credor retomar o bem, é necessário pagar as parcelas
vencidas e vincendas (integralidade), aplicando o vencimento antecipado da
obrigação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário