quinta-feira, 19 de março de 2015

SEMINÁRIO 25 - MÓD. III - TEORIA GERAL DO CONTRATO

ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” - Especialização em Direito do Consumidor
Módulo 3 - Seminário 25, de 28/10/2014
TEORIA GERAL DO CONTRATO

1 – Conceituar “autonomia privada” e “liberdade contratual”.
R: Na autonomia privada os particulares têm o poder de celebrar contratos e regular, pela sua própria vontade, as relações de que participam, podendo estabelecer não só o conteúdo, mas também a respectiva disciplina jurídica, desde que não viole direitos e garantias fundamentais, assim como toda e qualquer lei limitadora desse direito. É o princípio pacta sunt servanda que irá nortear essa relação porque fará lei entre as partes a manifestação de suas vontades no contrato, inclusive na proteção de interesse de terceiros. Então, a autonomia privada resume-se na liberdade que as pessoas possuem de se manifestar livremente acerca de suas avenças, regulando seus próprios interesses.
A liberdade contratual revela-se como um limite da autonomia privada na medida em que se preocupa com o conteúdo e não com a liberdade de contratar, que é um princípio legítimo conferido no art. 421, do Código Civil. No entanto, nesse mesmo dispositivo encontra-se um freio que estabelece que o interesse coletivo ou o interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana suplantará a autonomia privada. Isso para garantir a função social do contrato que, modernamente, é utilizado para garantir justiça e equidade nas relações contratuais. 
2 – Há autonomia privada e liberdade contratual na relação entre fornecedor e consumidor? Como se caracteriza a liberdade do consumidor? Como se caracteriza a igualdade das partes?
R: Nos contratos paritários as partes podem dispor, alterar, acrescentar e inserir cláusulas nos contratos, de forma que possuem plena autonomia e liberdade para contratar. No entanto, com o advento da sociedade contemporânea, a maioria dos contratos entre consumidor e fornecedor é de adesão, em que o consumidor tem autonomia para contratar ou não, mas a sua liberdade contratual é limitada, pois não há sua participação na elaboração do contrato e não há, também, liberdade para modificar ou excluir cláusulas, sendo obrigado a aceitar os termos dispostos no termo de adesão.
Assim, com o fim de igualar a relação entre as partes, o CDC reconheceu a condição vulnerável e hipossuficiente do consumidor e editou normas protetivas a esse, de forma que as cláusulas abusivas serão nulas de pleno direito, devendo ser suscitada até de ofício pelo magistrado.

3 – Os direitos fundamentais incidem sobre os contratos de consumo? Caso positivo, em que medida? Busquem exemplos de cláusulas contratuais que representem a violação de direitos fundamentais.

R: Sim, os direitos fundamentais (direitos individuais: vida, liberdade, igualdade, segurança e propriedade; direitos coletivos, direitos sociais etc) incidem sobre os contratos de consumo. O princípio maior, o da dignidade da pessoa humana, sempre estará presente nesses contratos e, a partir dele se subsaem os princípios da igualdade, da harmonia e o da vulnerabilidade que foram incorporados ao Código de Defesa e Proteção do Consumidor com o objetivo de igualar a disparidade entre consumidor e fornecedor na contratação de produtos e/ou serviços. É nessa medida que é aplicada a base principiológica do CDC visando materializar os direitos fundamentais numa relação de consumo que, por sua natureza, já nasce desequilibrada.
Exemplo de contrato consumerista em que há violação de direitos fundamentais é o contrato privado de seguro saúde ou plano de assistência à saúde em que uma de suas cláusulas se estipula reajustes em detrimento da idade avançada ou simplesmente que determine o cancelamento do contrato ao atingir determinada idade; outro exemplo é o contrato de prestação de serviços essenciais (água, luz, gás) em que há corte do fornecimento por inadimplemento do consumidor, levando-o a uma situação degradante, desrespeitando seu direito à dignidade, à vida, à saúde, à integridade física e moral.
4. Analisar, em sala de aula, o Acórdão da Apelação nº 1.283.795-5, votos vencedor e vencido. Fazer comentários sobre cada uma das posições, em especial na análise da autonomia privada.
R: O acórdão em evidência deu provimento ao recurso de apelação em ação civil pública julgada improcedente, onde a ANADEC pretendeu declaração de nulidade de diversas cláusulas inseridas nas normas gerais regulamentadoras de contas bancárias administradas pelo Banco Safra, sob o argumento de que implicam em danos patrimoniais ao consumidor e a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.
O voto vencedor reconheceu a aplicação do Código de Defesa do Consumidor para afastamento de cláusulas consideradas abusivas, a despeito de o contrato ser de adesão. Ressaltou que as normas consumeristas são de ordem pública, daí a pertinência de sua incidência, ainda que de ofício para permitir a revisão contratual. Ressaltou que a abusividade das cláusulas analisadas também decorre da ofensa à boa-fé.
Outrossim, o entendimento majoritário justificou a ausência de oportunidade que permita considerar presente a autonomia privada na contratação, na medida em que o caráter adesivo do contrato não permite reconhecer que houve ampla e plena liberdade no ato de contratar.
Culmina por fundamentar a possibilidade do pronunciamento judicial através de ação civil pública, tendo em vista que, em se tratando de contrato de adesão prescindível a análise casuística para se apurar se há ou não prejuízo a cada contratante; a mera adesão às cláusulas ali discutidas é suficiente para se configurar o dano patrimonial.
Por outro lado, o voto minoritário fundamenta que a natureza adesiva do contrato, por si só, não tem o condão de permitir a presunção de existência de cláusulas abusivas ou ilegais. Ainda, sustenta que a alegação de abusividade deverá ser discutida individualmente, no caso concreto.
O posicionamento vencido neste julgamento entende pela aplicação da autonomia privada, uma vez que reconhece a “criação de normas jurídicas primárias por meio de contrato” e exalta a ampla liberdade de contratar, a qual é limitada tão-somente no princípio da ordem pública.

Portanto, o voto vencido reconheceu a validade das cláusulas contratuais discutidas na ação civil pública considerando que cada contrato é celebrado por agente capaz e com a liberdade inerente à prática deste ato, não se justificando a declaração de nulidade pretendida.

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