ESCOLA
PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso
de Pós-Graduação “Lato Sensu” - Especialização em Direito do Consumidor
Módulo 3 -
Seminário 22, de 09/10/2014
DIREITO DE
ARREPENDIMENTO NO CDC
1) Como inserir o “direito de arrependimento” conferido ao
consumidor nos âmbito da proteção constitucional e dos direitos básicos do
consumidor? A proteção legal foi suficiente? É possível defender-se, a partir
da proteção constitucional e dos direitos básicos do consumidor, uma
desistência imotivada mesmo quando a compra é feita “dentro do estabelecimento”?
R: O instituto do direito de arrependimento encontra-se regrado no
art. 49 do CDC e traz a possibilidade de o consumidor desistir da aquisição de
um produto ou serviço, quando a transação se der fora do âmbito do
estabelecimento ou loja, fisicamente compreendida.
Fora do estabelecimento podem ser as aquisições de produtos ou
serviços feitas pela internet, por
telefone, pelos correios, por catálogos de porta em porta, em “stands”.
O consumidor tem o prazo de 7 (sete) dias para exercer seu direito
de arrependimento, devolvendo o produto ou serviço, independentemente de
motivação.
A lógica jurídica é proteger o consumidor das aquisições por
impulso, bem como da impossibilidade que não lhe é dada de tatear o objeto ou
verificar o serviço, não tendo, com isso, a certeza absoluta de que o produto
ou serviço lhe atenderá integralmente. Busca, portanto, garantir ao consumidor
o direito à liberdade de escolha, à proteção contra a publicidade abusiva, o
direito à informação, muitas vezes exposta de forma vaga pelo fornecedor.
A desistência imotivada é pressuposto para o exercício do direito
de arrependimento, não podendo essa desistência ser utilizada quando as
aquisições de produtos ou serviços se derem pessoalmente, no estabelecimento
comercial, porque nesse local, junto aos representantes do fornecedor
(vendedores), o consumidor, quanto aos produtos e serviços dispostos pode
esclarecer dúvidas, obter informações mais detalhadas, tatear o objeto ou
verificar o serviço, testar, escolher, pedir descontos, etc; diferentemente
daquelas aquisições feitas fora do estabelecimento.
2) Qual a natureza do “direito de arrependimento” previsto
no CDC? E se o fornecedor, durante a oferta, mencionar “trocamos produtos
somente aos sábados” ou se o vendedor informar ao consumidor sobre a possibilidade
de troca do produto, há reflexo sobre o “direito de arrependimento”?
R: O direito
de arrependimento previsto no artigo 49 do CDC tem natureza jurídica de
resilição, visto que representa o desfazimento de um contrato por simples
manifestação de vontade do consumidor. Ressalta-se que não pode ser confundido
com descumprimento ou inadimplemento, pois na resilição a parte apenas não quer
mais prosseguir.
A
lei não é expressa quanto à obrigatoriedade de o fornecedor efetuar a troca dos
produtos quando não presentes vícios, contudo caso o fornecedor ofereça a
possibilidade de troca deverá cumpri-la na forma e condição ofertadas.
O
direito de troca (pratica do mercado) em nada prejudica o direito de
arrependimento (previsto em lei), em virtude de aquele ser uma forma de
alteração do negócio jurídico ao passo que este é simples manifestação acerca
do desfazimento de negócio e retorno à situação anterior.
Conclui-se,
portanto, que os institutos da troca e do direito de arrependimento são
diversos e não podem ser confundidos.
3) O que significa “fora do estabelecimento comercial” no
art. 49 do CDC? A compra em ‘sites’ da internet (‘Americanas.com’ ou ‘Submarino’)
são inseridas naquele conceito? E compra em ‘stand’?
R: “Fora do
estabelecimento comercial” são consideradas as negociações efetivadas por
telefone (por meio de televendas); em domicílio (venda porta a porta), por
correspondência (por meio de mala direta ou qualquer outra maneira por
intermédio postal).
De igual modo, o avanço
tecnológico surgido após o advento do CDC, mediante o uso da rede mundial de
computadores (internet) e daí decorrentes os ‘sites’ de vendas de produtos
também se qualificam como modalidade de venda fora do estabelecimento comercial
para fins do que estabelece o artigo 49 da legislação consumerista. O mesmo se
aplica para uma compra efetivada em ‘stands’.
O
direito de arrependimento visa proteger a real vontade do consumidor, sendo
certo que esta somente pode ser bem refletida de maneira distanciada das
técnicas de vendas e marketing exercidas tanto a domicílio quanto na “sedução”
oferecida nos anúncios encaminhados via
postal, por telefone ou mesmo pela internet.
É
evidente os benefícios conferidos aos fornecedores com a venda fora do
estabelecimento comercial, mas a finalidade do CDC impõe a proteção ao
consumidor levado à vulnerabilidade que decorre de situações que impossibilitam
a reflexão madura sobre a contratação, tais como a impossibilidade de comparar
o produto com outros disponíveis no mercado, o exíguo tempo para concretização
do negócio e a dependência irrestrita às informações que foram prestadas pelo
vendedor ou mesmo através de catálogo.
4) Operada a desistência na forma do art. 49 do CDC, pode o
fornecedor exigir do consumidor despesas ou multa contratual? Ver acórdão da apelação
nº 1.319.223-9 - o fato de o consumidor haver sido sorteado para despertar seu
interesse pelo produto e comparecer ao estabelecimento apenas para formalizar a
contratação fazia ou não incidir o art. 49 do CDC?
R: Operada a
desistência decorrente do direito de arrependimento regulado pelo artigo 49 do
CDC, não se vislumbra pertinência na cobrança de despesas ou multa contratual
pelo fornecedor.
Isto,
porque esta modalidade de desistência remete às partes ao estado anterior à
contratação, de tal modo que o parágrafo único do dispositivo legal em
evidência confere ao consumidor o direito à devolução imediata dos valores
pagos a qualquer título.
Considerando
a casuísta relatada no julgamento do recurso nº 1.319.223-9, de rigor a
incidência do direito de arrependimento previsto no CDC. Ora, deve ser
considerado que houve um processo de captação de cliente (consumidor) em
momento anterior à formalização do contrato na sede do estabelecimento.
O
caso concreto nos indica que a consumidora foi atraída por meio de sorteio em
promoção para adquirir um dos cursos fornecidos pela empresa. Disso se conclui
representar “chamariz” para atrair consumidores, que são impulsionados pelo
“sorteio”; considerado nesta hipótese como meio de marketing agressivo,
circunstância que não permitiu prazo de reflexão racional e livre de qualquer
artifício nesta venda emocional.
Assim,
pertinente conceder à consumidora o direito de arrependimento no prazo legal de
sete dias para que pudesse, de fato, concluir pela real necessidade daquele
serviço.
5) Quais os direitos do consumidor em situação de
superendividamento, atualmente? Qual a previsão no projeto de reforma do CDC?
R: Como o problema do superendividamento envolve
política de crédito e direito do consumidor, atualmente o CDC necessita de mais
mecanismos para a sua solução. No entanto, o consumidor pode se valer de alguns
direitos já consagrados, tais como conter o abuso de vontade do fornecedor de
crédito em cláusulas abusivas (art. 51); liquidar o débito total ou parcial de
forma antecipada, com redução proporcional dos juros e demais acréscimos (art.
52, § 2º); direito à informação de maneira clara, adequada e inequívoca acerca
do número e periodicidade das prestações (art. 52, IV), e a soma total a ser
pagar, com e sem financiamento (art. 52, V).
Entende-se
por superendividamento a impossibilidade manifesta do consumidor, pessoa
física, de boa-fé, de pagar o conjunto de suas dívidas não profissionais,
exigíveis e vincenda; é o que preceitua o art. 104-A, § 1º do PL 283/2012, o
qual está em tramitação no Congresso Nacional, tendo como objetivos aperfeiçoar
a disciplina de crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção do
superendividamento.
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