sexta-feira, 27 de março de 2015

SEMINÁRIO 32 - MÓD. III - CONTRATOS ELETRÔNICOS

ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA
4º Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” – Especialização em Direito do Consumidor
MÓDULO 3 - Seminário 32, de 12/02/2015
CONTRATOS ELETRÔNICOS

1)                 Num contrato eletrônico no qual o consumidor expressa sua vontade por meio de um clique e o website está programado para responder positivamente, pode se falar em encontro de vontades? A qualificação jurídica seria de contrato (centrado na autonomia negocial) ou haveria um novo instituto jurídico? A legislação atual é suficiente para regulação desse novo fenômeno social (comércio eletrônico)?
R: O comércio eletrônico é uma realidade da qual não se tem como retroceder. As crianças já nascem no meio eletrônico e até negociam serviços, como o de jogos, fazem também aquisição de produtos, utilizando-se de senha e usuário dos pais.
Trata-se de um contrato eletrônico de adesão oriundo de uma relação de consumo estabelecida entre uma empresa virtual e o consumidor. As cláusulas vêm predispostas (impostas). Basta o consumidor aceitar com um clique no campo destinado a aceitação da adesividade contratual eletrônica para que haja o encontro de vontades.
Quando o CDC foi editado, em 1990, o comércio eletrônico sequer existia no Brasil. Em 2013 foi publicado o Decreto 7962/13 regulamentando o CDC no que tange à contratação no comércio eletrônico.
Embora o Código, juntamente com a dita regulamentação, seja de notável alcance nas áreas jurídica, administrativa, processual e penal mostra-se insuficiente para impedir ou atacar situações abusivas ou enganosas no comércio eletrônico de produtos e/ou serviços.
Por conta disso já foram aprovadas no Senado projetos de lei que pretendem atualizar o CDC. Um desses projetos, o Projeto de Lei do Senado nº 281 (PLS nº 281/12), dentre outros pontos, prevê que na contratação por meio eletrônico ou similar, o fornecedor deve enviar ao consumidor a confirmação imediata da aceitação da oferta, inclusive por meio eletrônico. Outro exemplo é a previsão de proibição do envio de mensagens eletrônicas não solicitadas caso não haja relação de consumo anterior com o fornecedor e o consumidor não tenha manifestado consentimento prévio em recebê-la, ou, pelo contrário, tenha manifestado ao fornecedor o interesse em não recebê-la.
2)                 Um contrato eletrônico de consumo firmado por uma criança de dez anos utilizando a senha do representante legal é valido? (justificar à luz do CDC e, se for o caso do próprio CC de 2002).
R: Contrato eletrônico é aquele onde duas ou mais pessoas utilizam a internet como meio para manifestar suas vontades e concluir um contrato.
Os princípios balizadores de tais contratos são, além daqueles aplicáveis aos contratos em geral, os princípios da equivalência funcional dos contratos eletrônicos com os tradicionais, neutralidade e perenidade das normas reguladoras do ambiente digital, conservação e aplicação das normas jurídicas existentes aos contratos eletrônicos e boa-fé objetiva.
O contrato presume a existência de agente capaz, ou seja, a pessoa que tem aptidão para realizar um negócio jurídico.
De outro modo, deve-se lembrar de que “eletrônico” é o meio pelo qual as partes escolheram para efetivar o contrato, tendo em vista que, em geral, a lei não exige forma específica, o contrato pode ser realizado sob qualquer forma, desde que não contrarie a lei.
O quesito da validade está diretamente ligado à segurança e estabilidade que se espera dos contratos no mundo jurídico. É a possibilidade de se valer daquele documento como prova processual ou como título representativo de uma obrigação.
Válido, portanto, é tudo aquilo que está de acordo com o ordenamento jurídico vigente e que atende aos princípios gerais do direito, à ética e à justiça sociais. Para avaliar tal validade, é necessário observar os elementos de validade dos contratos eletrônicos, os quais podem ser subjetivos, objetivos ou formais.
Os elementos subjetivos dizem respeito às características pessoas dos contratantes, ou seja, a capacidade das partes e o consentimento não viciado.
É válido o contrato realizado por pessoas capazes, assim consideradas pelo Código Civil, como os maiores de dezoito anos, desde que não estejam com as faculdades mentais comprometidas.
Assim, os atos praticados por um absolutamente incapaz são passíveis de nulidade, enquanto que os praticados por um relativamente incapaz estão sujeitos à anulabilidade, como se vê nos artigos 166, inciso I e 177, inciso I, ambos do Código Civil.
Tais normas têm por finalidade a proteção dos incapazes e, portanto, na prática, são relativizados os atos cotidianos praticados por estes, pois se presume a aceitação dos pais.
Porém, no que tange à contratação eletrônica, não se pode considerar como corriqueira a aquisição de produtos por menores através da Internet, tendo em vista apenas a facilidade de acesso e navegação. Deve-se analisar no caso em concreto se o ato praticado pelo incapaz era um ato em que se poderia presumir a aceitação dos seus responsáveis legais.
Vale ressaltar que a relativização da incapacidade para os atos corriqueiros é um caso excepcional que considera a realidade fática da situação. Assim, estão juridicamente sujeitos à anulação ou anulabilidade, desde que solicitada pelo representante legal.
O Código Civil traz a situação específica do menor que realiza um contrato ocultando a sua idade ou fazendo-se passar por agente capaz no art. 180, in verbis:
Art. 180. O menor, entre dezesseis e dezoito anos, não pode, para eximir-se de uma obrigação, invocar a sua idade se dolosamente a ocultou quando inquirido pela outra parte, ou se, no ato de obrigar-se, declarou-se maior.
Depreende-se deste artigo que, ao menor aplicar-se-á o princípio da boa-fé e a máxima de que ninguém pode se beneficiar da sua própria torpeza, devendo seus representantes legais responder pelos prejuízos causados.
Por conta disso é que os sites de compras pela Internet trazem formulários onde é solicitado ao usuário o preenchimento de alguns dados pessoais, tais como data de nascimento e, ainda advertem que é proibida a contratação com menores de dezoito anos.
Concluímos neste caso, que apesar de ser necessário observar os requisitos de validade de um contrato, devemos levar em consideração o caso concreto e a forma como foi realizada a contratação, neste exemplo, o contratante apesar de ser uma criança de 10 anos, tinha acesso não só à internet como também à senha do representante legal, devendo o mesmo responder pela aquisição do contratante, mesmo sendo agente incapaz. Vale lembrar que já existem decisões neste sentido em nossos tribunais.
3)                 A) Nos contratos bancários eletrônicos, como se aferir a adesão do consumidor ao contrato – já que não há assinatura? B) De outra parte, como deveriam agir os fornecedores para poderem impor as cláusulas contratuais, especialmente limitativas do direito do consumidor (CDC, art. 54, §4°)? C) Como se interpretar o artigo 46 do CDC no contrato eletrônico? D) Se houver fraude na contratação de um empréstimo pela Internet, a responsabilidade será do banco (fornecedor) ou do titular da conta (consumidor)? E) A alegação de que a senha era de responsabilidade do consumidor é fundamento bastante para se identificar a culpa do último e se excluir a responsabilidade do banco? F) Numa operação de empréstimo eletrônico feito numa conta-conjunta, a responsabilidade é solidária entre os consumidores correntistas ou apenas de quem realizou o empréstimo? (analisar os acórdãos enviados, inclusive do TJSP).
R: A) Nos contratos eletrônicos a adesão do consumidor à prestação de serviços ou fornecimento de produtos pode ser auferida mediante procedimentos de segurança como: a) usuário e senha - nessa modalidade o consumidor fornece diversos dados pessoais, que garantem considerável certeza de que é realmente ele quem está os fornecendo e, a partir daí, cria-se um usuário e senha de uso pessoal e intransferível, de responsabilidade do consumidor, para assegurar a pessoalidade almejada; b) ICP-Brasil - certificado brasileiro de assinatura eletrônica, de uso pessoal e intransferível, sob a responsabilidade do usuário, que consiste em autenticar documento com uma assinatura eletrônica do usuário previamente cadastrado; c) biometria - método bem seguro de autenticação que consiste na leitura bioindividual (leitura de digital ou da íris) que garantem inequívoca certeza de que é o usuário que utilizou o serviço ou autenticou o documento. 
Os bancos se utilizam do método de login e senha, sendo o login os dados de agência e conta do consumidor e a senha um número previamente cadastrado, para contratação de serviços e para movimentação bancária. Contudo, mais recentemente algumas instituições vêm utilizando-se da biometria, principalmente com a leitura das digitais dos dedos ou da palma da mão. 
B) As cláusulas do contrato de consumo devem sempre, limitativas de direito ou não, constar nos contratos de forma clara, precisa e que facilite a compreensão do consumidor. Já as limitativas devem constar, além da forma já mencionada, com destaque, ostensivamente e de forma clara. Não obstante, cabe ao consumidor discutir o conteúdo das cláusulas que sejam abusivas, não sendo os contratos de adesão válidos pela simples concordância do consumidor.
C) Os contratos eletrônicos devem ser redigidos de modo a facilitar a compreensão de seu sentido e alcance, assim como os contratos não eletrônicos. Contudo, com relação à prévia disponibilização do conteúdo para ciência do consumidor, o fornecedor que utiliza o meio eletrônico deve apresentar os termos em tela anterior à contratação, inclusive devendo o consumidor dar o seu aceite antes da possibilidade de realizar a efetiva contratação. 
D) Em caso de fraude na contratação bancária pela internet por terceiros, deve haver a inversão do ônus probatório para que o fornecedor apresente as informações comprobatórias de que o consumidor, de alguma forma, contribuiu ou facilitou para que o fraudador tivesse acesso à transação. Do contrário, é de plena responsabilidade do fornecedor a garantia da prestação de um serviço de qualidade e que ofereça segurança ao consumidor.
E) Não, para que não haja responsabilização do consumidor deve haver demonstração de que ele de algum modo contribuiu para que terceiros tivessem acesso à sua senha. Pois, além da senha, existem outros métodos ilícitos de acessar o banco on line, sendo de responsabilidade do fornecedor desse tipo de serviço proporcionar a segurança adequada. 
F) A solidariedade nas obrigações não se presume. Ou decorrem de acordo entre as partes ou da lei. Na contratação de empréstimo por um dos correntistas na conta conjunta não há previsão legal acerca de solidariedade nesse tipo de relação. Se o contrato tiver previsão expressa, de forma ostensiva, clara, objetiva pode haver esse tipo de responsabilidade, mas apenas pela sistemática da conta conjunta não é possível configurar a solidariedade passiva entre os consumidores.
4)                 No “comércio eletrônico”, qual o papel do site que promove a intermediação (exemplo: “mercado livre”)? E quando ele faz a gestão do pagamento? Há responsabilidade solidária entre o referido site e o vendedor (fornecedor) do serviço pela não entrega? E no caso de vício? (analisar a partir dos acórdãos enviados).
R: O site de intermediação na internet exerce o papel de fornecedor (art. 3º, Caput, CDC), sendo responsabilizado pela divulgação de um produto ou serviço (art. 14, do CDC), não podendo se eximir de culpa quando há algum dano que o consumidor venha a sofrer, pois a gratuidade do serviço não desvirtua a relação de consumo (art. 3º, §2º, do CDC). Nesse contexto, o termo “mediante remuneração” deve ser amplamente considerado também nos ganhos indiretos, conforme o Resp. nº 1.308.830 – RS (2011/0257434-5/Relatora Min. NANCY ANDRIGHI). O Site “Mercado Livre” também atua como guardião da quantia paga pelo consumidor durante quatorze dias e age como intermediador nessa relação, informando ao fornecedor que a outra parte já efetuou o pagamento e, para isso, cobra taxas que variam de 2,99% a 9,99%, através de seu parceiro o (Mercado Pago). 

Sobre o Acórdão enviado para análise houve responsabilidade solidária entre o vendedor e o Site PagSeguro (art. 7º, Parágrafo único, CDC), pois houve vício por falta de informação clara e por inadequação (art. 6º, III, do CDC). Não basta o prazo de 14 dias para que o consumidor lance mão da ferramenta “disputa”, é necessário que ele tenha 14 dias para informar sobre algum vício a partir da data prevista informada pela vendedora, em que o bem deveria ser entregue, no caso, 45 dias. Não se pode olvidar que o site vende confiança e segurança e são esses valores que atraem o consumidor, pois permeiam qualquer relação de consumo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário